A história do Super Nintendo e Super Famicom

Com o Famicom e NES, a Nintendo conseguiu um alcance surreal. Em seu primeiro console de mesa, tornaram-se quase onipresentes nos lares americanos e japoneses, perdendo só em mercados menores como o europeu e sul-americano. Nintendo virou sinônimo de videogame.

Mas na alvorada dos anos 90, o "precioso" já não ia tão bem das pernas. O tempo passou e ele não era capaz de competir com máquinas modernas que surgiram em seu rastro. Do alto da montanha de dinheiro e poder que construiu, a Big N não estava preocupada. Ninguém achava provável que uma insignificante como a Sega fosse ameaça pra levar a sério; apesar de fortes no arcade, haviam passado quase em branco com o Master System. Não parecia preciso apressar-se na trilha, um dia inevitável, dos 16-bit. O sucessor estava a caminho, mas enquanto não surgisse uma ameaça real, continuariam vendendo o "Nintendinho".

O resultado foi um desastre. Com marketing agressivo e ótimas conversões de arcade, o Genesis foi se consolidando na América quase sem resistência. No Japão, a NEC ganhava terreno com o PC Engine. Quando se deu conta, a Nintendo apanhava por todos os lados.

Irma Zandl, presidente do Zandl Group, empresa especializada em marketing direcionado a jovens, define a disputa de modo claro:

Basicamente, a Sega espancou a Nintendo. Eram muito mais agressivos em marketing e desenvolvimento, e estavam realmente afinados com o que os garotos daquela idade queriam.

Ou se moviam ou perderiam o controle, talvez em definitivo. Com essa perspectiva, o staff liderado pelo lendário Hiroshi Yamauchi decidiu que era hora de andar pra frente. Com trabalhos de Masayuki Uemura, designer do Famicom original, era delineado o Famicom 2, que durante o progresso, tornou-se Super Famicom. Lançado no fim de 1990 (pouco depois como Super Nintendo na América), caberia ao 16-bit recuperar o tempo e espaço perdido.

Na máquina que revelaria clássicos e ícones imortais, nascia também a guerra de consoles mais acirrada da história.

Super Nintendo logo europeu
Logotipo europeu do Super Nintendo, com as mesmas cores do japonês.

Outras partes da série História dos Videogames:

Veja também a Ficha técnica

Passeio no Japão

Protótipo do Super Famicom
O protótipo do Super Famicom foi divulgado em 1988, bem diferente do que seria a versão final.

Quem ficou a cargo do projeto foi a divisão Nintendo R&D 2, comandado por Uemura. A princípio, a Nintendo entendia que a CPU deveria ser 16-bit, mas retrocompatível com o Famicom. Continuar jogando cartuchos que já tinham poderia estimular donos de Famicom a investir na nova plataforma.

O processador seria uma versão atualizada do 6502 8-bit, para garantir a compatibilidade. Mas logo viram que isso encareceria o custo de produção e foi deixado de lado. Como opção, pensaram num adaptador – um Famicom ligado ao slot de cartuchos –, mas não foi adiante e o Super Nintendo acabou sem retrocompatibilidade.

A primeira notícia do Super Famicom foi no Kyoto Shimbun, em 09/09/1987, com a manchete "Super Famicom 16-bit. Compatível com o Famicom". Outros jornais calculavam o preço inicial: 20 mil ienes. Foram 2 anos entre a versão final e o primeiro protótipo, exibido em dezembro de 1988, com diferenças principalmente estéticas, como botões do controle: vermelhos com letras A B C D, e E F para os botões de ombro.

Lançado no Japão em 21/09/1990, o Super Famicom teve preço inicial de 25 mil ienes (cerca de 210 dólares), para deleite dos jogadores locais. Mantendo-se fiéis à marca, praticamente não deram atenção ao concorrente Mega Drive, presente há tempos. Até o PC Engine teve mais atenção dos japoneses que o console da Sega. O sucessor do Famicom era aguardado com ansiedade e as 300 mil unidades iniciais esgotaram-se depressa. Algumas lojas deixaram de aceitar encomendas semanas antes, tamanha a procura na pré-venda, com mais de 1,5 milhão de pedidos.

O alvoroço foi tanto que o governo japonês pediu que futuros lançamentos fossem agendados para fins de semana. A histeria chegou ao ponto de surgir o temor de que a máfia Yakuza fosse atraída pelo desejado item. A Nintendo adotou a "Operação Envio Noturno", transportando e distribuindo o primeiro lote do Super Famicom durante a noite. Isso reduziria o risco de um ataque de bandidos, que poderiam depois revendê-los com preço inflacionado.

Apesar de ter só dois jogos no lançamento (Super Mario World e F-Zero), foram o bastante para manter o público entretido nos primeiros dias, dando boas amostras do potencial da máquina. Os gráficos avançaram muito em relação ao Famicom, com efeitos conhecidos como Mode 7 — rotação e escala de camadas de fundo para geração de falso 3D.

Se em casa o Super Famicom abria caminho para um futuro de 80% de participação, na América a história era outra. O Genesis havia fincado estaca e não parecia disposto a ceder. A Sega percebeu a maior falha do novo rival – velocidade do processador – e tramou como usar aquilo em seu favor. Sonic the Hedgehog, um game super veloz, era perfeito para acusar essa lentidão do Super Nintendo.

Mas a "casa de Mario" provaria que nem só de velocidade se faz um bom console.

América: guerra com a Sega

O Super Famicom foi redesenhado e lançado nos Estados Unidos como Super Nintendo em 23/08/1991. A mídia dava como certo que ele seria o futuro dominante, algo do tipo "acabou a festa do Genesis".

Mas a Sega revelou-se um rival duro. Explorando pequenas falhas do adversário, com ajuda do ouriço azul levou seu 16-bit a um nível ainda mais alto. Surgiu o Blast Processing, referência à velocidade de processamento do Genesis, melhor ainda se comparado a CPU do SNES: 7,67 contra 3,58 MHz.

A Sega fazia questão de provocar e dar nomes aos bois em comerciais e ações públicas. Como parte da campanha Blast Processing, um comercial comparava o Genesis a um dragster (protótipos de provas de arrancada) e uma van lerda e pesada ao SNES.

Mas o ligeirinho Sonic não foi suficiente para "matar a cobra". Nos anos seguintes os consoles disputaram a atenção do público, numa divisão de interesse. Uma batalha console a console, lançamento a lançamento numa guerra comercial. E foi surpreendentemente difícil para a Nintendo, com o Genesis chegando a mais de 60% de domínio.

A Nintendo não contava mais com exclusividade dos desenvolvedores, como no tempo do NES – o governo americano havia considerado monopólio no fim da geração anterior. Mesmo assim, teve grande apoio de softhouses. O SNES era claramente a melhor plataforma disponível em termos técnicos. A Capcom, velha parceira, licenciou hits como Final Fight e Street Fighter II; esse foi exclusivo por quase um ano antes de chegar ao Genesis. A Square foi vital com seus grandes RPGs como Secret of EvermoreFront MissionFinal Fantasy e Chrono Trigger.

Política de conteúdo da Nintendo

A Nintendo ainda tinha certo controle e não abria mão de sua política "familiar". Uma de suas exigências aos parceiros era a limitação no nível de violência.

Jogos polêmicos foram modificados quando portados para o Super NES, como Wolfenstein 3D e o primeiro Mortal Kombat. Fatalities e outros golpes que envolviam violência extrema foram suavizados; sangue foi descolorido, decapitações sumiram. Como o jogo no Mega Drive manteve-se quase intacto (através de um código), a versão SNES foi superada em vendas em proporção de 3 ou 4:1. Seguiu-se um massacre de vendas e boa parte da crítica, que prejudicou bastante a Nintendo. No período, a Sega aproveitou para expandir sua vantagem americana com o Genesis.

A crescente violência nos jogos foi alvo de debates que chegaram ao senado americano. A Sega foi tachada como irresponsável por publicar conteúdo adulto, como em Night Trap e o próprio Mortal Kombat sem censura. A Nintendo se esforçava para manter seu público cativo de crianças e famílias, mesmo se precisassem censurar jogos. As empresas trocaram farpas durantes as sessões do senado, acusando-se mutuamente.

A Sega ofereceu a todo o mercado seu sistema de classificação etária para games, o VRC, mas a Nintendo o recusou. No ano seguinte, foi estabelecido pela Entertainment Software Association o ESRB. Ele permitiu à Nintendo lançar jogos com um nível mais elevado de violência e assim vieram versões fantásticas de Mortal Kombat 2Killer Instinct e outros.

Inovações e características

Design do Super NES
Esboços iniciais feitos por Lance Barr, publicados pela revista Nintendo Power em junho de 1991

O hardware do Super Nintendo trouxe avanços em gráficos e sons na geração. A paleta foi a 32 mil cores, contra 512 de Mega Drive e Turbografx. O Mode 7 foi um conjunto de recursos que permitiam rotacionar e redimensionar uma camada. Assim eram criados efeitos de profundidade, como nas pistas de F-Zero e nos mapas de ActRaiser.

O chip de som, desenhado por Ken Kutaragi [biografia] (que mais tarde seria o "pai do PlayStation") usava a tecnologia de wavetable. Com amostras reais de áudio, as trilhas não soavam mais como bips modulados: pareciam instrumentos de verdade. Games como Rock 'n' Roll Racing abusaram disso em faixas com guitarras e baixos. Temas orquestrais ficaram magistrais, com violinos e órgãos. O ponto fraco era a compactação das amostras, que filtradas na descompactação, muitas vezes faziam a música soar "abafada". A baixa qualidade incomodava mais ou menos em cada situação.

Super NES oxidado
Um típico SNES com o case amarelado pela ação do tempo.

Todas as versões tinham carcaça num tom de cinza; cinza bem claro com botões púrpura no SNES e um cinza médio predominante no Super Famicom. O design americano foi de Lance Barr, que havia feito a bela adaptação do NES em relação ao Famicom. A parte superior do slot do cartucho foi arredondado para evitar o descanso de alimentos ou bebidas sobre o console – o topo plano teria causado acidentes no NES e também Super Famicom.

Ao mesmo tempo, ficou mais "quadrado" por questão estética, como o designer explica:

O Super Famicom talvez fosse bom para o mercado do Japão. Para os EUA, sentia que era muito soft e sem bordas. Estávamos sempre pensando em futuros componentes modulares, então você tinha que desenhar o console com a ideia de colocá-lo em cima de outros componentes. Achei que o Super Famicom não ficaria bem se empilhado e mesmo sozinho, tinha um visual meio "saco de pão de forma".

Os botões do controle, coloridos no Super Famicom, ficaram no mesmo tom de púrpura do Reset e Power; os cabos, mais longos nos controles americano e europeu. O plástico de parte da carcaça, tanto do Super Nintendo quanto Super Famicom, é do tipo ABS. Suscetível à oxidação, com o tempo tende a ganhar um tom amarelado forte. Por isso hoje são vistos consoles antigos "bicolores".

Os cartuchos americanos e asiáticos são incompatíveis, de encaixe diferente. Mesmo que os europeus sirvam no slot do japonês, ainda assim não funcionam, pois há também verificação de região via chip. O software é 100% regional (barreira superada com modificações ou adaptadores).

A guerra dos consoles

Contra o Mega Drive, o Super Nintendo venceu, pelo menos em números, uma das mais acirradas guerras de consoles na América. A rivalidade envolveu outras empresas, imprensa e jogadores. A Sega vendia seu aparelho como veloz, moderno e cool, para atrair adultos e jovens, ao mesmo tempo em que ridicularizava o concorrente como "console para crianças".

Super Nintendo anúncio
No lançamento do SNES, a Nintendo reafirmava suas vantagens, como o Mode 7.

A tática se mostrou muito bem sucedida nos Estados Unidos e mesmo durante o auge de ambos, o Genesis chegou a dominar 60% do mercado. Mais tarde, jogos como Street Fighter II e Zelda (fora erros da Sega) começaram a mudar a história.

Não houve, em momento algum da disputa, dominação absoluta de uma empresa ou outra. Até meados de 1993, os dois lutavam pela liderança com ligeira vantagem do Genesis. Só quando a Sega do Japão apressou a descontinuação do sistema em favor do Saturn, houve um salto da Nintendo, praticamente sozinha no campo dos 16-bit.

Mesmo em fim da geração, a Nintendo seguiu lançando títulos para Super NES e foi a decisão certa. Principalmente Donkey Kong Country, de  1994, estufou seus cofres enquanto o do rival era dilapidado. Até a última gota do hardware foi extraída em jogos como Donkey Kong Country 3 e Street Fighter Zero 2, quando o PlayStation já circulava.

A Nintendo lançaria ainda uma versão redesenhada conhecida como Super Nintendo Jr., modelo SNS 101. Compacto, teve o slot de cartucho simplificado, botões reset e power movidos para o lado esquerdo e sem porta de expansão. Por isso, é incompatível com o acessório de rede Satellaview, mas não fazia diferença: era um produto de entrada, direcionado a quem não podia comprar máquinas da nova geração como o Nintendo 64. O controle foi pouco alterado, ganhando o logo da Nintendo em relevo em vez do impresso original. Foram produzidos entre 1997 e 2003, quando enfim o Super Nintendo foi descontinuado, encerrando seu ciclo aos 13 anos.

Donkey Kong Country SNES
Donkey Kong Country foi uma das últimas grandes séries do SNES.

Quem vendeu mais?

Os números definitivos na América são incertos. Segundo publicação da própria Nintendo em 2007, teriam sido cerca de 20 milhões de SNES, mesmo estimado para o Genesis. Em seus últimos dois anos o Super Nintendo vendia muito mais, mas como o Genesis liderou boa parte da geração, acredita-se num possível "empate técnico".

No Japão a história foi diferente, sem qualquer margem para dúvida. O Super Famicom deu uma surra impiedosa no rival, com cerca de 18 milhões de unidades. A Sega vendeu no máximo 3,5 milhões de Mega Drives.

Na Europa e Brasil, o Mega Drive ganhou com certa facilidade. Os motivos seriam a falta de presença oficial da Nintendo e o caminho pavimentado pelo Master System. Mas não foram vendas tão expressivas como nos EUA e Japão, principais mercados. Com isso, o SNES terminou com vantagem global, num placar estimado em 49 x 40 milhões.

Alguns acham que o Mega Drive ganhou a guerra por "peitar" uma máquina mais moderna no maior mercado do mundo. Outros apontam o Super Nintendo vencedor, pela vantagem global e seu hardware superior.

Super Nintendo no Brasil

Donkey Kong Country 3 Playtronic
Anúncio de Donkey Kong Country 3 nacional: a chegada oficial da Nintendo foi legal, mas demorou demais

Em 1993, Gradiente e Estrela formaram a Playtronic, empreendimento conjunto de eletrônicos para representar oficialmente a Nintendo. Após anos de presença não-oficial (pirata), enfim fãs da marca teriam as vantagens do produto nacional. Nintendo, Super Nintendo, Virtual Boy, Game Boy, Nintendo 64, cartuchos e acessórios seriam fabricados em Manaus.

Junto viriam garantia, sistema de cor adequado, atendimento telefônico Power Line e todos os benefícios para atrair consumidores. O mercado de games no Brasil alcançava US$100 milhões, ou seja: lucros à vista para a Nintendo.

Segundo publicações da época, pela primeira vez produtos Nintendo seriam fabricados fora do Japão. Componentes como chips vinham prontos de fora, para posterior montagem de cartuchos e consoles. Não muito diferente do que a concorrente Tectoy fazia, recebendo componentes e montando aparelhos e acessórios em Manaus, com ocasional transcodificação de sistema de cor. De qualquer forma, um melhor preço em relação aos importados estava à vista e claro, competição à Tectoy.

Os preços de lançamento ficaram entre 250 dólares para o Super Set (com dois controles e Super Mario World) e 200 dólares (um controle e sem jogo).

O marketing foi intenso, mas como muita gente já tinha comprado o SNES via importação, o sucesso foi moderado. Três anos depois, a Estrela pulou fora do negócio e a Gradiente passou a tocá-lo sozinha como Gradiente Entertainment e não mais Playtronic. Seguiram até 2003, quando deixaram o ramo em definitivo devido à alta taxa do dólar e a pirataria. Foi o fim da breve estadia da Nintendo na terra brasilis, pelo menos naquele momento.

Acessórios e serviços

Foi lançado um mouse para maior liberdade de criação do que o controle, útil para para games e aplicativos como Mario Paint. Para tiro, a bazuca Super Scope era promissora, mas não teve muitos títulos. O Super Game Boy é um adaptador para jogar games do portátil no SNES. Aparecem ainda bastões de baseball, multitaps, controles tipo arcade e / ou com funções, para usar códigos (Game Genie) e no Japão, até modem para conexão via satélite com o Sattelaview.

SNES CD
O esperado dispositivo de CD ficou só no projeto, mas não fez tanta falta... ou fez?

O controle padrão do Super Famicom adicionou 4 botões em relação ao Famicom:

  • Dois a mais, Y e X, na face, ficando em YX BA.
  • Dois de ombro, L e R, acionados com os dedos indicadores ou médios.

Essa configuração com seis botões trouxe conforto em adaptações de arcade como Street Fighter II. Seu formato "osso de cachorro", também desenhado por Lance Barr, foi referência para design futuros, como o do NES 2 (NES-101). Entre os famosos que replicaram o estilo do SNES total ou parcialmente, estão PlayStation, Dreamcast e Xbox. Praticamente todo mundo adotou botões de ombro, hoje universais.

Super Nintendo CD

Rumores sobre o lançamento de um acessório para jogos em CD sempre rondaram o Super Nintendo, mas jamais se concretizaram. Uma tentativa aconteceu em parceria com a Sony, que tinha interesse no mercado de hardware. Cogitaram um add-on acoplado ao Super Famicom ou até um console independente de 16 ou 32-bit.

Foi projetado um dispositivo chamado Play Station: um Super Nintendo embutido que também rodaria jogos em CD no formato Super Disc. Mas o acordo assinado previa que a Nintendo dava à Sony direitos e lucros sobre jogos em CD a nível mundial; a Nintendo ficaria com os cartuchos. Outra divergência era que a Nintendo queria proteção contra cópia no CD, que ficaria encapsulado num case plástico com um chip de verificação de autenticidade. A Sony preferia a verificação no console.

Insatisfeito com o acordo que haviam assinado, o presidente da Nintendo, Hiroshi Yamauchi [biografia], ordenou que fossem sondar a Philips. Queria uma alternativa – mesmo que fosse preciso violar o contrato com a Sony. O Play Station chegou a ser anunciado na CES de 1991, com drive para Super Disc e CDs de áudio, e também slot para cartuchos do Super Nintendo.

snes cd playstation
O Play Station, protótipo de console para rodar CDs e jogos do Super Famicom. Quando a Nintendo buscou a Philips para desenvolver outro aparelho mais vantajoso comercialmente, o projeto foi refeito pela Sony, resultando no PlayStation.

Para surpresa geral, no dia seguinte, Howard Lincoln, vice-presidente da Nintendo da América, subiu ao palco na mesma CES e anunciou que a Philips desenvolveria o SNES CD. O SNES CD daria controle de software à Nintendo, que por sua vez permitiria à Philips produzir jogos com alguns de seus maiores nomes, como Mario e Zelda. Seria lançado no fim de 1992, por cerca de US$200.

A Nintendo enfrentou certa resistência no Japão – afinal, passaram uma empresa japonesa para trás para se aliar aos holandeses da Philips. A Sony continuava interessada em alguma parceria. As três partes se acertaram para trabalhar numa única máquina fabricada pela Nintendo, o SNES Nintendo Disc Drive (ou Philips CD-ROM XA, ou ainda Super Nintendo ND). Seria um add-on 32-bit para o SNES e compatível também com o formato CD-i. A Nintendo teria direitos sobre jogos, a Philips sobre o conteúdo em CD-i e a Sony ficaria com outras mídias como enciclopédias, aplicativos, etc.

Com constantes atrasos, o aparelho não prosseguia. A Nintendo, já envolvida com o Project Reality (futuro Nintendo 64) foi perdendo o interesse e o projeto foi cancelado. A Philips lançou seu próprio aparelho: o Philips CD-i, que rodava jogos e discos multimídia nesse formato. A Sony converteu o que tinha em seu próprio console, o PlayStation inaugural.

SNES na rede: Satellaview

Entre 1995 e 1999, funcionou com exclusividade no Japão o serviço Satellaview. Com um modem para conexão ao sinal de rádio via satélite difundido pela St.GIGA, subsidiária da TV WOWOW. Eram fornecidos música, games (alguns exclusivos, outros versões enriquecida de clássicos), notícias e outros conteúdos para assinantes.

O serviço distribuiu vários títulos, divididos em quatro grupos:

  • Games da Seleção dos Melhores (ゲームベストセレクション) – versões de games mais vendidos e populares do Famicom e do Super Famicom, às vezes idênticos aos originais, outras, remixados e melhorados em gráficos e funções adicionais.
  • Games de Eventos Mensais (マンスリーイベント) – eventos em que os jogadores competiam contra outros usuários do Satellaview para formar um ranking nacional. Eram divulgados nas revistas do serviço e no site da Nintendo, e o vencedor ou alguns dos melhores ranqueados recebiam prêmios de pequeno valor.
  • Games Originais BS (BSオリジナルゲーム) – games lançados antes pelo Satellaview e também novidades para games conhecidos, distribuídos como "BS" - BS Zelda e BS Mario Excitebike, por exemplo. A maior parte continua exclusiva.
  • Games SoundLink (サウンドリンクゲーム) – adicionava áudio aos games, com gameplays narrados. Como as narrações começavam num horário fixo, tal como um programa de rádio, jogadores do país todo precisavam iniciar a jogada ao mesmo tempo. Havia competições durante esses "programas", distribuindo prêmios.
BS Super Mario USA
Tela da Nintendo com assinatura da St.GIGA em BS Super Mario USA

Com 512 KB de memória interna, o Satellaview vinha com o cartucho BS-X: A História da Cidade Cujo Nome Foi Roubado (それは名前を盗まれた街の物語). Era um software que servia como sistema operacional, mas parecido com um jogo. Na inicialização, o usuário digitava seu nome, selecionava um avatar masculino ou feminino e o movia pela cidade do título. Casas e lojas serviam como locais de download de games, dados, revistas digitais, etc. O download era armazenado numa memória temporária, até que o jogador baixasse outro game para ocupar o lugar.

Além de downloads, podia-se também viajar para locais na cidade como o "Jornal do Mural" (kabe shinbunsha). Ali o jogador lia mensagens de texto da St.GIGA e Nintendo que anunciavam vencedores de competições, notícias sobre lançamentos e detalhes da programação. O avatar tinha inventário e dinheiro virtual para gastar em itens como cartões telefônicos, tickets de estacionamento, iscas para peixe e sapatos para o avatar deslizar em vez de caminhar.

Mesmo sem qualquer desafio comum aos games, o software do BS-X tinha enredo. Alguns games aprofundaram a exploração da "cidade cujo nome foi roubado", como BS-X Shooting e SatellaWalker. A versão SoundLink de SatellaWalker tinha elementos típicos de RPG com o avatar do jogador sendo o protagonista de aventuras.

Os mascotes do sistema, Parabô (robô-antena) e Satebô (robô-satélite), eram os assistentes. Ilustrados por Noriko Kitamura e Masaru Nishida, apareciam no manual do Satellaview, revistas, anúncios e certificados dos eventos.

Satellaview avatar parabo satebo
Os avatares masculino e feminino do BS-X (esq.), e os mascotes Parabô e Satebô.

Como o sistema tinha só 512KB de memória, precisava de um módulo com 8 MB para arquivos maiores. Esse módulo era encaixado no slot do BS-X; hoje são preciosidades para o pessoal da emulação, já que cada um encontrado pode conter dados de software lá guardado e ainda não preservado.

Alguns jogos e DLCs publicados pelo Satellaview:

  • Chrono Trigger Jet Bike Special (o minigame de jetbike de Chrono Trigger)
  • Radical Dreamers (história paralela de Chrono Trigger)
  • F-Zero 2 Grand Prix
  • BS Zelda no Densetsu (BS The Legend of Zelda)
  • S Zelda no Densetsu: MAP2 (BS The Legend of Zelda:MAP2)
  • BS Zelda no Densetsu: Inishie no Sekiban (BS The Legend of Zelda: Ancient Stone Tablets)
  • Zelda no Densetsu: Kamigami no Triforce (BS The Legend of Zelda: Triforce of the Gods)

Em 1997, o Satellaview teve seu melhor, momento com mais de 115 mil assinantes.

Chips especiais e jogos

Nintendo Super FX anúncio
Anúncio do chip Super FX prometia uma revolução nos games.

O chip Super FX, produzido pela britânica Argonaut Software, foi uma grande inovação. Permitia melhor escala e rotação que o Mode 7 e gráficos poligonais que o CPU sozinho não calculava. Ainda que o resultado fosse de baixa qualidade, impressionou na época. Com ele nasceu uma das grandes franquias da Nintendo, Star Fox.

Como a Nintendo foi procurada pela Argonaut antes do lançamento do SNES, chegaram a considerar a adição do chip ao console, mas desistiram por questão de preço. Tirando Star Fox, jogos com o SFX não fizeram grande sucesso, como Stunt Race e Dirt Trax. O SFX2 rendeu uma inesperada e boa versão de Doom, além dos incríveis efeitos visuais de Super Mario World 2: Yoshi's Island.

Leia também → A incrível história do Super FX

A Capcom desenvolveu o Cx4, para cálculos matemáticos nos Mega Man X2 e Mega Man X3. O SA1 (Super Accelerator 1) foi usado por alguns jogos como Super Mario RPG e Kirby Superstar para aumentar o clock, lidar com dados comprimidos e outras melhorias.

O SNES marcou pela quantidade de grandes RPGs, além da franquia principal e dos spin-offs de Mario como Mario KartSuper Mario RPG, etc.  A Nintendo explorou o máximo do hardware ao decidir suportá-lo mesmo no fim da geração. A parceria com a Silicon Graphics rendeu uma boa novidade tecnológica nos quase obsoletos 16-bit: a série Donkey Kong Country e seu pseudo-3D.

As séries de RPG foram clássicas. Final Fantasy entra nas listas de melhores da história, tal como Chrono Trigger com trama envolvente e trilha sonora beirando a perfeição. Mario pulou em plataformas, andou de kart e fez mil estripulias; o fino da Capcom esteve presente com Street Fighter em várias versões (II, Turbo e Zero 2) e Mega Man em jogos enormes e cheios de efeitos.

É um acervo quase incomparável de clássicos: The Legend of Zelda, Super Metroid, Contra, Castlevania, Final Fantasy III, Top Gear...

Legado

O SNES é figura certa em listas de melhores videogames da história, mas atrás de outros que inovaram ou marcaram mais como NES e PlayStation 2. Deixou padrões como o design e configuração dos controles, mas as evoluções em gráfico e áudio foram relevantes mais para o momento da Nintendo do que como legado. Chips de som baseados em wavetable, por exemplo, era comum em computadores mas algo diferente em consoles da época. Funcionou, mas perderia a relevância na geração seguinte com o advento dos CDs.

Os gráficos 2D também não tinham mais futuro, com o 3D dos 32-bit batendo à porta. Não por acaso, as experiências mais inovadoras do SNES foram no tridimensional do Super FX e no pseudo-3D de Donkey Kong Country.

O que marcou mesmo foram jogos, com várias franquias históricas começando ou virando gigantes. Mesmo não tendo um reinado similar ao do NES, o SNES superou colegas de 4ª geração em quase tudo: foi líder de vendas, teve um dos melhores hardwares e o maior acervo de títulos. Foi insuperável no quesito RPG, alguns revisitados até hoje.

O Super Nintendo poderia ter sido o último grande console a usar cartuchos. Mas ao contrário de concorrentes, a Nintendo preferiu seguir com eles no Nintendo 64 e seus Game Paks.

Emulação

Entre os primeiros projetos de emulação estão o VSMC, de 1994, e o Snes96. Esse evoluiu para o Snes9x e hoje é um dos mais estáveis e usados para jogar SNES no computador.

Opções incluem o também popular ZNES e o Higan, multi-emulador para sistemas Nintendo que começou como derivação do bsnes. Ele roda jogos de Famicom, Super Famicom, Game Boy, Game Boy Color e Game Boy Advance. Para quem gosta de achievements, o site Retroachievements distribui uma versão modificada do Snes9x, o RASnes9x.

Leia também → Achievements em games antigos no Retroachievements

A Nintendo se declara contrária aos emuladores, tendo em seu site uma longa palavra a respeito. A empresa os define como violação de seus direitos autorais e "grande ameaça a toda a indústria". Os usuários se defendem com argumentos como o direito do dono do cartucho a usar seu jogo como e onde quiser, a dificuldade em obter certos títulos importados e a facilidade para desenvolvedores de homebrews.

A discussão continua, mas disputas legais anteriores indicam que a emulação não é considerada crime – ao contrário do download de ROMs e outros conteúdos protegidos.

Leia mais sobre isso em Emuladores: afinal, é legal jogar neles ou não?

Daniel Lemes
Daniel Lemes
Fundador do MB, quase mil artigos publicados em dez anos pesquisando e escrevendo sobre games. Ex-seguista, fã de Smashing Pumpkins e Yu Suzuki.

10 COMENTÁRIOS

  1. Olha, um ótimo aparelho.
    Mais eu gostei mais do Mega Drive.
    Mais o aparelho é bacana mesmo.

    Jogo até hoje na minha Rasp4.

  2. O primeiro nunca se esquece, não é? Há não muito aliás deu vontade de remexer em clássicos e agora é pra valer, que o digam meus Donkey Kong Country e Super Mario World, ótimo texto!

  3. Console esse do qual sou apaixonado desde o primeiro dia que o joguei, na época da escola todos estavam ansiosos para por a mão e testar esse novo console de 16bits da Nintendo. E foi com Super Mario World e Mortal Kombat a inicio! Época de ouro da qual quem viveu não esquece.

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