Listas: games mais estranhos do mundo #2

Seguir normas é legal, mas tem horas que a gente quer algo diferente. Sem os estranhos, o que seria do mundo? Graças a caras que topam sair da mesmice, a arte não fica presa eternamente a certos padrões.

Aliás, é da arte maldita que nascem alguns. Edgar Allan Poe foi um dos sujeitos mais estranhos da literatura, levou uma vida sofrida. Mas sem seus estranhíssimos contos que misturavam romance com macabro, muita coisa não existiria, ou seria bem diferente. Andy Warhol fez um pouco de tudo, até arte com urina.

O game design, como trabalho criativo, também tem um lado artístico — mesmo que o objetivo final seja o consumo. Games insólitos fora do cenário indie são raros; vender é crucial para manter a desenvolvedora ativa, e acaba não sobrando espaço pra viajar.

De vez em quando alguém sai da linha. Também no Ocidente, mas especialmente no Japão, com valores morais diferentes da América (e por extensão, nossos), brotam uns frutos anormais. Foi assim que uns doidões imaginaram e realizaram um jogo em que você controla um pernilongo. E uma criatura com uma boca na barriga, dando linguada nos inimigos. Ou ainda um simulador de banho.

Como diria o poeta, abençoados sejam os estranhos. Alguns games estranhos, para sua diversão estranha.

Mister Mosquitto

PlayStation 2, 2001

Logo de cara porque é tranquilo um dos mais estranhos. Desenvolvido pela Zoom e publicado para o PlayStation 2 no Japão em 2001, o jogo o coloca no controle de um simpático pernilongo. Seu objetivo, claro, é chupar sangue; no caso, da família Yamada que inclui pai, mãe e a filha.

A cada fase, uma cena com a família em casa, e o "herói" precisa encher seu depósito de sangue picando partes específicas do corpo. Não bastasse ser "fofinho", o Sr. Pernilongo tem um forte elemento cômico, com resmungos, estrelinhas na cabeça ao trombar em objetos, e o bizarro aumento de volume (vira uma bola de tanto sangue).

Tudo deve ser feito sem alertar a vítima, ou inicia-se um modo de batalha. O mosquito pode então acertar "pontos de relaxamento", partes do corpo que fazem a pessoa se acalmar. Se errar, leva tapão e game over. Hilário.

The Stanley Parable

PC, 2003

Lançado em 2013 para PC, The Stanley Parable é a própria definição da esquisitice. O jogo — se é que cabe o termo — começa com um sujeito trabalhando ao computador. Sua tarefa era simples como apertar teclas sempre que fosse solicitado. O mundo se resumia a isso até que, certo dia, os comandos pararam de chegar.

O que fazer? O personagem se levanta e começa a explorar o prédio. E basicamente o jogo é isso, todo em primeira pessoa. Você pode se mover e interagir com objetos, como gavetas, portas, etc. Uma voz — do próprio personagem — conversa com você durante o caminho, contando o que fez naquele dia, como se tudo fosse lembrança de eventos. Mas você pode contrariá-lo: quando ele diz algo tipo "Encontrei duas portas, e entrei na primeira", podemos escolher a outra porta, mudando a história.

Pra quê? Afinal, qual o objetivo do narrador, se é que existe um? Só jogando pra entender, ou não. Na versão remake, há 22 finais possíveis, mas encare em paz porque o jogo é curto. Jogo ou como quiser chamar.

Rinse and Repeat

PC, 2015

Rinse and Repeat não deveria entrar na lista por ser produção independente — de Robert Yang, um professor da NYU Game Center. O cara já tinha feito doideiras antes, como The Tearoom, simulador de banheiro público com temática gay e caras chupando as pistolas uns dos outros. Não no sentido figurado: digo armas mesmo; isso porque o Twitch vivia banindo seus vídeos

Yang criou outro simulador de banheiro, dessa vez de banho coletivo. Você está lá em primeira pessoa tomando seu banho com outro manolos, quando um sujeito barbado e de óculos chega e... Bom, como sugere o título (Enxaguar e Repetir), você vai dar banho no cara, esfregando partes de seu corpo e ganhando recompensas se fizer o "trabalho" bem feito.

Definitivamente um teste da sua masculinidade. Curioso é que se teve que substituir genitais por armas em The Tearoom, em R&R há só um efeito pixelado. É grátis, e pode ser baixado aqui, então pra quem curtir, corre lá. Mas cuidado com o Twitch: o game também foi banido em vídeos por lá.

LSD: Dream Emulator

PlayStation, 1998

Lançado em 1998 para o PlayStation, o Emulator antecipa: não é um jogo, mas um emulador. Não emulador de consoles: um emulador de sonhos.

Produzido pelo artista japonês Osamu Sato, não há qualquer objetivo além da contemplação e interação. Você pode se mover e tocar objetos num ambiente psicodélico e onírico. A principal inspiração não foi uma viagem ácida: teria sido um diário de sonhos de Hiroko Nishikawa, funcionário da Asmik (produtora e publicadora).

Tudo é muito colorido, com personagens estranhos e situações absurdas até para os games. Sua descrição é "um sonho jogável". Não há estrutura parecida com jogável, contudo. O mais próximo disso são fases — ou melhor, sonhos —, que têm no máximo dez minutos de duração. Se o "jogador" cair num abismo ou tocar certos personagens ou objetos, ele muda de ambiente/sonho.

Por sua natureza tão peculiar, LSD: Dream Emulator saiu apenas no Japão, e desde então, ganhou status de cult. O site Hardcore Gaming 101 o classifica em seu review como "o que mais efetivamente oferece a sensação de estar sonhando".

Fatman

Commodore 64, 1989

Fatman Mega Drive Modu

Mais conhecido como Fatman, Tongue of the Fatman foi produzido em 1990 pela Activision, para o Mega Drive (originário do Commodore 64, um ano antes). O jogo de luta tem um dos designs de personagem mais estranhos de que se tem notícia. São 10 raças de... seres, incluindo um cara verde, um feito de quadradinhos, e aberrações do gênero.

O protagonista, que dá nome ao jogo, é nosso amigo aí acima, Mondu The Fat. Na introdução, ele aparece como o campeão e chefe supremo de um tipo de torneio de luta mortal, estilo chupinhado fortemente de Jabba the Hut, incluindo umas mulheres. Só faltou a Leia Escrava (no lugar, um tipo de sereia).

Por que Tongue? Seu ataque principal é uma língua enorme que sai de uma boca em sua barriga e golpeia os inimigos. O jogo é tenebroso, com gráficos fraquíssimos, música nível 8-bit e controles medonhos.

Mr. Bones

Saturn, 1996

Em 1996, Mr. Bones apareceu como boa opção do Saturn. Não era exatamente a tecnologia que o povo queria, mais fiel aos jogos de plataforma 2D. Por outro lado, o game desenhado por Ed Annunziata (mesmo de Ecco the Dolphin e Vectorman) tinha uma mistura de gêneros interessante e principalmente, humor negro sensacional.

Você controla o esqueleto conhecido como Mr. Bones, que aprende a tocar guitarra com um cego. Ele usa o instrumento para converter para o bem as caveirinhas e monstros sob domínio do maléfico DaGoulian. O cara é um feiticeiro filósofo que planeja colocar sua tese em prática: para existir o bem, o mal precisa prosperar. Ele toca seus tambores mágicos para criar uma horda de caveiras, mas Mr. Bones não entra na onda do sujeito e resolve lutar contra.

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Review - Mr. Bones

A trilha sonora, composta e executada por Ronnie Montrose, é só um dos destaques. A ação varia do clássico hop 'n bop, como em Sonic ou Mario, para fases de puzzle e claro, tocar guitarra. O melhor são as cenas intermediárias.

Seaman

Dreamcast, 1999

Quem lembra de Glub-Glub, que passava na TV Cultura nos anos 90? Pois eis que aquela coisa estranha de peixes com rosto de gente foi parar no Dreamcast. Sem qualquer relação com o seriado brasileiro, Seaman é um tipo de "bichinho virtual" de maiores proporções. Seu objetivo é criar peixinhos dourados com pequenos detalhes...

O barato é permitir ao jogador dar comandos simples aos animais através do microfone. Você interage da mesma forma que faria com os Tamagochi, de forma geral, cuidando da alimentação e demais atenções que os seres precisam. Se ficar muito tempo sem jogar, pode apostar que o bicho terá morrido na próxima vez que ligar o console.

O peixe é exigente, e demanda cuidados como se fosse rei, tipo "Me dê alimento agora!", e "Estou morrendo de fome!". Outras vezes só reclama ou comenta suas ações, como ao aquecer a água ("Ah, estou começando a me sentir mais aquecido"). Pra ficar mais estranho, a Leonard Nimoy, aquele, dá dicas.

Por que não pensaram em personagens mais fofinhos, tipo a Nintendo com seu Nintendogs? Vai saber...

Pu-Li-Ru-La

Arcade, 1991

Lançado em 1991, esse arcade da Taito passou quase despercebido no Brasil. Eu mesmo nunca vi fora do MAME (teve versão para PlayStation bem depois). É um beat 'em up para até dois jogadores, com uma trama de fantasia.

Até aí, normal. A loucura está no design. O estilo é cartunesco e colorido, com inimigos como robôs e animais. De repente, aparecem pessoas digitalizadas fazendo coisas totalmente fora de propósito (4:40 do vídeo acima). Ou então um chefe de fase como uma mulher (?) com um nariz gigante elástico, usando biquíni roxo e botas vermelhas. Ou ainda um caracol com bico de ave. Parecem saídos de algum pesadelo indigesto.

Em outro ponto, uma parede cheia de fotos digitalizadas que vão de gueixas ao traseiro de um lutador de sumô. Num dos bônus, corpos humanos com cabeça de peixe pulam sobre você. Um forno microondas cai no meio da tela. E numa cena removida da versão americana, pernas femininas, usando meias longas vermelhas, saem de duas portas, sendo a do meio... você imagina a posição.

O que mais dizer de um game em que bônus são porcos, pintinhos e ornitorrincos?

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Gostou? Temos outro artigo sobre games estranhos, confira.

Daniel Lemes
Daniel Lemes
Fundador do MB, quase mil artigos publicados em dez anos pesquisando e escrevendo sobre games. Ex-seguista, fã de Smashing Pumpkins e Yu Suzuki.

3 COMENTÁRIOS

  1. Cheguei a jogar Puli Rula no Saturn, em locadora de um conhecido meu. Era muito estranho. Ainda lembro de um chefe cujo ataque era uma "chifrada" , só que com um artefato que deveria ser sua cueca.

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