Em 1996, o Game Boy era um aparelho consagrado, mas já um tanto antigo. Lançada em 1989 no Japão, a tecnologia simples e divertida de Gunpei Yokoi estava quase atravessando a segunda geração de consoles, e seguia firme como grande nome dos portáteis. Tinha visto rivais coloridos como Game Gear e Lynx chegar e partir sem maiores traumas, e resistente ao tempo, teimava em ficar no mercado. Game Boy Color? Dali a pouco: faltavam dois anos para o "moleque" da Nintendo ganhar cores.
Antes de arrasar aqueles concorrentes, a Nintendo já caçava grandes títulos. Foi quando o jovem Satoshi Tajiri, com seu pequeno estúdio Game Freak, apareceu com o conceito de um novo RPG. Baseado em sua própria experiência de colecionar insetos na infância, ele pensou numa coleção de monstros, que usando um cabo de conexão entre os Game Boys, permitiria não só duelos, mas a troca de espécimes coletados. Seriam os "monstros de bolso".
Entre a apresentação do projeto e o lançamento dos primeiros jogos, Pocket Monsters Red e Green, foram quase seis anos. Claro que um upgrade do Game Boy seria bem vindo, mas afinal, não era tão importante. Se uma coisa ele tinha aos montes, como sempre, era público fiel, e sabem como funciona a vida lá pela Big N: se não precisa ser atualizado, não será. Então, apesar do "atraso", foi na telinha em preto e branco mesmo que rolou a estreia humilde.
Eles nem imaginavam o monstro que nascia. Depois de iniciada, a série não pararia mais, se convertendo numa fonte de dinheiro quase sem fim para as empresas envolvidas, como Nintendo, Game Freak, Creatures Inc e Pokémon Company, em produtos e mídias diversas.
De Pocket Monsters para Pokémon, foi um passo. Com episódios em vários consoles posteriores como Nintendo 64, DS, Gamecube e Wii, é sempre legal lembrar que tudo começou num arcaico Game Boy, inesperadamente alcançando milhões de cópias vendidas e dando um novo fôlego ao portátil.
Vamos ver as três primeiras gerações em três linhas do Game Boy: o clássico, o Color e finalmente o Advance.
Red and Green / Blue
1996. Eram lançadas para o Game Boy as primeiras partes da série com Pocket Monsters: Red e Pocket Monsters: Green.
Tajiri buscou na infância a inspiração, ao notar que as crianças já não saíam para explorar o mundo como ele fazia, quando caçava insetos. Como fazer uma geração que preferia os videogames do que a natureza sair para caçar? Se não pode vencê-los, junte a eles: leve a caçada até o público. Em vez de insetos, monstrinhos, e importante: em vez de mortos, eles simplesmente desmaiariam quando vencidos. Não era necessário expôr crianças à ideia da morte num jogo leve.
Depois de se aproximar da Nintendo com o projeto (pois já tinha interesse no kit de desenvolvimento do Famicom), ele ainda trabalharia em outros títulos como Yoshi (NES) e Pulseman (Mega Drive) antes de completar seu simulador de monstros. Shigeru Miyamoto trabalhou bem próximo dele, dando todas as orientações, motivo pelo qual o considera um tipo de "tutor" na carreira. Seu amigo de longa data, Ken Sugimori, liderou o pessoal do design de sua companhia, a Game Freak, e um time com não mais que 10 artistas fez as ilustrações de todos os 151 monstros da primeira "classe". A música ficou a cargo de Junichi Masuda, que apesar do som simplíssimo de quatro canais do Game Boy, conseguiu um resultado digno.
Tajiri pensou que a Nintendo fosse recusar o game, já que no início não estavam muito convencidos do que se tratava. A verdade é que quase ninguém acreditava, e Pokémon teve um começo lento. "Lembro de olhar as tabelas de venda e pensar que ficaríamos só nas imediações dos 10 mais vendidos", disse o produtor Tsunekazu Ishihara. Mas com o passar dos meses foi vendendo mais e mais, até se firmar com um dos games mais populares do Japão. Foi uma agradabilíssima surpresa para a Nintendo e para o próprio Tajiri, já que o Game Boy estava claramente em declínio.
Foi de Miyamoto a ideia de lançar vários cartuchos, cada um com uma coleção de monstros intercambiáveis, o que ao mesmo tempo despertaria o desejo de trocar entre as crianças, e claro, aumentaria as vendas. Meses depois de Red e Green veio a versão Blue japonesa; no resto do mundo, foram lançados como Pokémon: Red Version e Pokémon: Blue Version, sendo o azul baseado nos verde e azul do Japão.
A equipe pensou em várias coisas para aumentar o interesse dos jogadores. O programador Shigeki Morimoto colocou um personagem escondido, Mew. Ele só entrou na fase final, quando ferramentas de debug foram removidas e sobrou um insignificante espaço de 300 bytes! Era quase uma piada interna, algo que só a equipe saberia da existência; nem a Nintendo soube do personagem por muito tempo. Apesar de estar fadado a jamais aparecer qualquer referência, havia um pequeno bug que o fez surgir a poucos jogadores.
Através de promoções públicas, a Game Freak aproveitou o bug para aumentar o hype sobre os games, oferecendo Mew através de promoção. A simples menção à existência do "personagem invisível" foi como uma bomba, fazendo as vendas dispararem. "As vendas mensais que tínhamos começaram a ser equalizadas pelas vendas semanais, até enfim aumentar em três ou quatro vezes. Quando chegou ao primeiro lugar de vendas, havia se passado mais de um ano e meio desde o lançamento", lembrou Ishihara.
Entre mais de 78 mil participantes, 20 receberam o upload de Mew em seus cartuchos. Todos receberam também um certificado de autenticidade. Depois vieram outras promoções, sempre com Mew como prêmio, mas ele também era encontrado através do bug.
O sucesso de Pokémon foi tão grande, que até 1997 já tinham vendido mais de 10 milhões de cópias só no Japão, e mais de 9 milhões na América. Aclamado como um dos melhores jogos do Game Boy, e até então, um dos RPGs mais vendidos (tinha mais Pokémon a caminho...), brotaram produtos derivados de toda espécie: de animação e cartas, a bichos de pelúcia e brinquedos. A mania não tinha volta.
Gold and Silver
Depois da versão Yellow, que foi baseada na animação com Pikachu tendo destaque, veio a segunda geração com Gold e Silver. Trouxe várias novidades, principalmente o uso das cores do Game Boy Color, e um sistema de relógio que influencia o comportamento dos personagens e eventos determinados pelo dia da semana. Outras novidades foram o sistema de cruzamentos, Pokémons de cor alternativa (Shiny), o vírus Pokérus, etc.
Inicialmente prometido para 1998, o desenvolvimento começou logo depois dos primeiros games, mas o lançamento aconteceu só em 1999 no Japão e 2000 na América. O atraso foi causado por uma série de fatores, como a localização das versões Red e Green/Blue para o mercado americano, além do desenvolvimento do Pokémon Stadium para o Nintendo 64. As coisas ficaram meio loucas e aceleradas, porque lembre-se: nem o próprio desenvolvedor acreditava que tudo isso aconteceria.
Segundo Ishihara, a equipe trabalhou com a possibilidade das versões Gold e Silver serem as últimas ?:
"Após lançarmos Red e Green, começamos a trabalhar nesses títulos, pensando que os games definitivos de Pokémon só poderiam ser Gold e Silver [...] A razão de ter licenciado tantos produtos e desenvolvido coisas como o jogo de cartas foi basicamente para garantir o sucesso de Gold e Silver. Senti que esse era meu principal papel. Então na época, trabalhei com a ideia de que após Gold e Silver, meu trabalho com Pokémon estaria concluído. Pra mim, eles representavam o fim da linha".
Àquela altura já um fenômeno mundial, não seria tão fácil se livrar dos monstrinhos... Os lançamentos eram acompanhados por muita expectativa. Ao contrário dos games anteriores, essa geração se passa na região de Johto (a anterior, Kanto, também pode ser acessada). Além de manter toda a base da jogabilidade, foi incluída alguma retrocompatibilidade: os jogadores podiam trocar monstros da geração anterior. Isso DEVIA ser feito para completar o Pokédex sem usar glitches ou cheats, já que cada versão carregava monstros exclusivos, que não podiam ser obtidos nas demais versões.
O jogo também era compatível com o Game Boy Printer ou Pocket Printer, uma impressora térmica muito tosca lançada em 1998. Tal como no caso de Mew, foi inserido outro personagem de eventos, Celebi, acessível apenas através de promoções da Nintendo. O primeiro desses eventos foi o Nintendo Space World de 2000, com 100 mil premiados. A Nintendo estava tão otimista com o jogo que a primeira carga seria de 3 milhões de cartuchos, com previsão de até 8 milhões vendidos nos primeiros meses no Japão.
E foi muito, muito além disso: alcançaram juntos 23 milhões de unidades vendidas no mundo.
Ruby e Sapphire
A terceira geração tem seu núcleo no Game Boy Advance a partir de 2002 no Japão e 2003 no mundo com Ruby e Sapphire. Com a nova região, Hoenn, a jogabilidade não mudou essencialmente das outras versões: RPGs com visão superior.
Foi a primeira versão em que Ken Sugimori não desenhou ou revisou todos os Pokémons, embora ainda tenha sido o diretor de arte. Apesar da maior capacidade do Game Boy Advance, e de haver uma melhoria gráfica em relação às gerações anteriores, a equipe optou por manter as coisas simples, para evitar alienar parte do público.
"Gráficos básicos podem ao mesmo tempo limitar e melhorar o gameplay; por exemplo, se um mapa é muito realista, ele pode se tornar mais complicado, e então será mais difícil para os jogadores compreenderem aonde devem ir", explicou o diretor Junichi Masuda. A principal preocupação era que crianças, público-alvo da série, tivessem dificuldade.
Entre as novas características estavam quatro jogadores simultâneos, e a batalha em duplas, em que ações podem afetar tanto os oponentes quanto sua dupla de Pokémons. Os desenvolvedores afirmaram que apesar do novo modo, ele foi introduzido mais como um "bônus", já que o foco continuou sendo a batalha um contra um. Foi ainda o primeiro da série que não trazia todos os monstros da geração anterior.
A promoção foi feita numa campanha de 7 milhões de dólares, que incluiu um Chrystler PT Cruiser decorado como o Lugia — o mesmo carro havia sido usado na fase promocional das versões Gold e Silver. Nos primeiros quatro dias de venda no Japão, foram mais de 1 milhão de unidades, fechando a conta mundial em mais de 16 milhões de cópias — recorde do GBA. Foi até pouco para o universo da série, já que nessa época também era o auge da série concorrente Yu-Gi-Oh!.
As críticas foram positivas, mas com ressalvas da parte de quem esperava mais uso gráfico do GBA (nos jogos seguintes, LeafGreen e FireRed, remakes das versões Red e Green iniciais, o gráfico foi ligeiramente melhorado). Mesmo assim, aparecem nas listas de melhores jogos do portátil. A série continuaria com a chegada da quarta geração com Pokémon Diamond e Pearl, no Nintendo DS, além de remakes como HeartGold e SoulSilver.
Seja em monitor monocromático, colorido ou 3D, os "monstrinhos de bolso" seguem firmes e fortes, com a mais recente geração prometida para o mês de novembro em Pokémon Sun e Moon, exclusivos para o Nintendo 3DS. Ao que parece, eles não têm limite de tecnologia ou sucesso, e devem continuar por aí por muito tempo.
Legal, nada como pegar a "era clássica" dos jogos. Na real eu nunca me interessei muito, só fui jogar bem depois no N64 e agora com emulação alguns mais antigos. Mas os jogos dos portáteis são o DNA da série.