Atualizado em 30/01/14. Enfrentando o inevitável terceiro ano consecutivo de perdas, a Nintendo vem sendo alvo de críticas e desconfiança dos acionistas quanto ao seu modo de gerenciar. Satoru Iwata, antes inquestionável em frente a empresa de Kyoto, já não é visto de forma tão unânime dentro e fora dela. Só os fanboys mais radicais parecem ignorar a nuvem cinzenta que paira sobre a cabeça da Big N.
Tudo por causa do - pelo menos até agora - fracasso do Wii U. Depois de ver sua previsão de lucro com o novo console ruir pelas péssimas vendas, a Nintendo começa nessa quinta-feira (30/01) a dar pistas dos caminhos para manter alguma sanidade financeira nos tempos que virão. Recentemente foi anunciada a redução nas previsões de vendas de todos os principais produtos, incluindo o 3DS (de 18 para 13,5 milhões), enquanto o Wii U passou de 9 para apenas 2,8 milhões.
"A revisão é muito pior do que esperado," disse Yusuke Tsunoda, analista da Tokai Tokyo Securities. "Será o terceiro ano consecutivo com prejuízo operacional, o que levanta um problema sério de gestão".
Segundo especialistas da indústria, não se deve esperar uma grande mudança de direção. A companhia não vai entrar de cabeça nos games online ou oferecer Mario em celulares. O mais provável é que trabalhe ainda mais no marketing de seus carismáticos personagens, máquinas de vender que talvez consigam diminuir as perdas.
Segundo Jean Snow, especialista em games e redator baseado em Tóquio, levar Mario para a rede seria um passo muito grande para a conservadora e centenária empresa: "A rede é importante e a Nintendo é notória por não ter um grande sistema online".
Reservas. Mas que não se imagine, num eventual completo fracasso do Wii U, a Nintendo quebrada. Com mais de 8 bilhões de dólares em caixa - muito desse dinheiro feito com o Wii - e propriedade sobre suas ações, contam com "uma folguinha" para fracassar por alguns anos. A falha do Wii U só deixa a Nintendo atrás na corrida agora liderada por Sony e Microsoft. Analistas dizem que o Wii U está fracassando porque poucos games foram lançados - questões técnicas causaram um intervalo de 6 meses entre o lançamento do aparelho e o primeiro pacote de títulos.
Enquanto o Wii penetrou no lar de gamers novatos graças aos jogos de esporte com o sensor de movimentos, agradando da criancinha ao vovô, esse perfil de consumidores ainda não se convenceu da necessidade de atualizar seu console para outro mais caro e com um nome parecido. Ao mesmo tempo, jogadores "hardcore" são seduzidos pelos conteúdos mais "adultos" e maior poder dos hardwares de PlayStation 4 e Xbox One.
Iwata segue dizendo que conforme mais jogos vierem, especialmente das franquias vencedoras e exclusivas, a tendência é que as vendas do Wii U cresçam. Mas a verdade é que há poucos casos de consoles que começaram mal para se recuperar mais tarde, e as desenvolvedoras não terão interesse em trabalhar com plataformas fracassadas.
Claro que o Wii, quando lançado, também era alvo de chacotas pela inferioridade gráfica em relação ao PlayStation 2 e Xbox 360, e acabou mesmo assim indo ao topo. Mas será que os "casuais" ou "gamers de primeira viagem" vão segurar a onda da Nintendo de novo?
Reduzir custos. A Nintendo tinha um orçamento recorde de 70 bilhões de ienes (cerca de 680 milhões de dólares) para pesquisa e desenvolvimento, enquanto o custo de produção de um game, com os novos gráficos e funções sofisticadas, têm ficado entre 2 e 3 bilhões de ienes.
Mas com as perdas, o anúncio de quinta-feira deve focar na redução de custos. A Nintendo já se moveu nesse sentido ano passado, ao unir seus departamentos de jogos portáteis e de console. Alguns investidores duvidam da eficácia de tais ações e pedem medidas mais drásticas, como licenciar games para outras companhias e entrar no mercado de smartphones.
As excelentes vendas do PlayStation 4 e Xbox One sugerem que a famosa ameaça dos celulares aos consoles foi exagerada, enquanto a Nintendo mantém sua posição firme de que partir para esse setor reduziria o valor de seus personagens. Se assim for, restará torcer para que o apelo dos exclusivos seja suficiente para transformar o Wii U de fracasso anunciado à nova fênix no mercado de videogames.
Ou buscar outras fontes de ganho. "Em vez de licenciar Mario para outras empresas, eles podem criar um filme ou uma série de TV" - diz Hideki Yasuda, analista da Ace Securities. "A Namco teve grande sucesso dessa forma com Gundam e Kamen Rider".
Atualização 30/01: na reunião de investidores de hoje, Iwata falou o que muitos já esperavam - a Nintendo vai sim tentar novos caminhos de reduzir as perdas, "pero no mucho". Não ficou claro como será, só que celulares serão usados para serviços - frisando que não, Mario e cia. não vão para lá.
"A Nintendo tem valor porque é diferente das outras" - disse, reiterando que devem ser exploradas facilidades oferecidas pelos celulares, mas não relacionadas aos games. A ideia é que tais apps sirvam para "criar conexões com os consumidores".
O mais misterioso foi o anúncio de um "salto estratégico" ao explorar a "qualidade de vida" com um produto "não-game". Se isso significa outro controle de movimentos ou um dispositivo totalmente independente ninguém (fora o staff da Nintendo) sabe, e mais detalhes serão divulgados ao longo do ano, mas o lançamento do seja-lá-o-que-for deve ocorrer no período fiscal de abril de 2015.
Iwata adiantou que o item não será usado no corpo, nem uma versão do Wii Balance Board, e nem usado na sala. "Nós redefinimos o conceito de entretenimento para tornar divertida a melhora da qualidade de vida das pessoas". Hein??
Ele também reafirmou a confiança no negócio de consoles. "Não estamos pessimistas sobre o futuro de plataformas dedicadas de videogame". Vão também se concentrar em criar mais games que usem a função tablet do gamepad do Wii U, coisa pouco explorada até agora.
Seja como for, a posição de não reduzir preços de seus produtos e não entrar na linha de games em celulares e tablets continua firme. "Quando nos adaptamos muito, perdemos o que temos de único" - concluiu Iwata-san, remetendo ao velho mantra de Hiroshi Yamauchi: "A pior coisa numa empresa de entretenimento é fazer o mesmo que todo mundo".
Com informações de Reuters e Eurogamer. Atualização: Verge e The Wall Street Journal