Em mais um aniversário, 10 fatos sobre a Atari

Nos últimos 43 anos a Atari passou por muita coisa, e apesar de ser só uma sombra do titã do passado, tem história pra contar.

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Anteontem (27/06) foi o aniversário de 43 anos da nossa querida Atari, a empresa que abriu caminho pra todas essas coisas que temos hoje em casa chamadas videogame. Se não fosse a iniciativa de Nolan Bushnell e Ted Dabney, com certeza a década de 80 — e as seguintes — teria sido bem menos divertida para todo o mundo.

Apesar de ser um ícone que extrapolou fronteiras, as mais de quatro décadas de estrada não correram macias pra eles. Depois de um começo arrasador, atingindo a glória e conquistando os bilhões de dólares em que se converteram Ataris 2600, viveram maus bocados com a quebra do setor em 1983, viram a fortuna ruir, a falência bater na porta, uma série de aquisições e fusões, até chegar à forma atual.

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Pois é, muita gente nem sabe que a Atari ainda existe além dos livros e revistas de história.

Leia também → História do Atari 2600

Entre grandes nomes e relatos, vamos relembrar 10 que envolvem o passado (às vezes não muito abonador) de gênios da tecnologia, ligações da Atari com outras empresas, curiosidade internas e a origem de títulos bem conhecidos.

Parabéns Atari, e obrigado por tudo!

10. A Atari ainda existe!

Atari Zombie, de Mike Biggs
Zumbi? Morto-vivo? Seja o que for, a Atari ainda está por aí. Ilustração: Mr. Biggs

Achou óbvio? É porque você manja dos games, mas pra muita gente menos íntima ou que perdeu o interesse há tempos, a ideia é que a companhia tenha desaparecido desde os anos 80, quando o Atari 2600 perdeu força. Parcial verdade, já que através de aquisições aqui e ali, a marca segue viva.

Com o fracasso de seus consoles seguintes (que de novo, muita gente nem sabe que existiram), a Atari viu uma sangria de dinheiro, que evaporou os lucros estratosféricos acumulados antes; no pior momento, contabilizavam 10 mil dólares de prejuízo diário. A Warner Communications cansou daquilo e "desovou" a divisão de games (Atari Consumer Electronics Division) sobre Jack Tramiel, fundador da Commodore, que a transformou em Atari Corporation.

Mais tarde, em 1996, a divisão foi fundida com a JTS, virando parte da inexpressiva fabricante de discos rígidos de San Jose — casamento de conveniência, já que a Atari tinha algum dinheiro mas nada pra investir (o Jaguar era um flop anunciado) e a JTS, muitos produtos mas pouco caixa. Mesmo assim a companhia faliu em 1999, e pouco antes as propriedades intelectuais da Atari foram parar com a Hasbro Interactive, e o nome, com a THQ para uso doméstico.

Mas o rolo não acaba aí: a Infogrames comprou a divisão da Hasbro em 2001, renomeando-a duas vezes, primeiro como Infogrames Interactive, e depois, Atari Interactive. Depois, adquiriu direitos totais sobre nome e marca, passando a ser Atari Inc. Em 2008, a Infogrames Interactive completou a aquisição da Atari Inc. com US$11 milhões em ações, virando sua subsidiária total. Foi caminho para reaparecer em "voos solo" com games para plataformas portáteis, redes sociais e até PlayStation 2 (Splashdown).

A situação da atual Atari SA é bem menos gloriosa do que o nome sugere. Andaram cambaleando, a divisão europeia foi fracionada com a Namco Bandai para não falir. Em 2013, o grupo (Atari Inc., Atari Interactive Inc., Humongous Inc. e California US Holdings Inc.) pediu recuperação judicial nos EUA, uma espécie de acordo para quitar dívidas com supervisão judicial. Relatórios recentes apontam lucros subindo mais de 200% no período 2013-2015, graças a títulos como RollerCoaster Tycoon Mobile, RollerCoaster Tycoon 3, Test Drive UnlimitedMinimum.

Morto-vivo? Zumbi? O maior dos fatos sobre a Atari é que sempre vai ter alguém interessado em manter um ícone vivo — enquanto for po$$ível.

9. Um arcade da Atari virou material de treinamento militar

Battlezone arcade
Brincadeira para uns, treinamento de guerra para outros.

O arcade Battlezone, criado por Ed Rotberg, atraiu a atenção do exército americano, que aproximou-se da Atari com um plano: queriam um programa de treinamento para tanques de guerra a partir do game. Rotberg fez alterações diversas, como um controle imitando melhor o verdadeiro (e serviu depois para outros arcades, como Star Wars), aumento de armas, upgrade total no sistema de colisões, entre outras.

O principal objetivo, em plena Guerra Fria, não podia ser outro: dar aos jovens um primeiro contato com sistemas que encontrariam nos veículos, aprender táticas e até como identificar tanques soviéticos. Havia um sistema de placar para cada tanque inimigo abatido, e possivelmente (Rotberg não lembra ao certo) perda de pontos se rolasse "fogo amigo". Tudo com base em esboços dos militares, que supervisionaram o processo.

Rotberg não curtiu nada trabalhar para o governo. "Eu odiei! Primeiro, porque o prazo era curto e tive que praticamente morar na Atari nos primeiros 3 meses de 1981. Uma perda de tempo na minha vida. Segundo, eu era veementemente contra a Atari nesse ramo de negócio. Lembremos que o mundo era bem diferente de hoje, a União Soviética era vista como nossa maior ameaça. Meu ponto é que muitos de nós, engenheiros, poderíamos ter escolhido trabalhar para companhias com contratos militares, mas escolhemos uma empresa não envolvida com isso. Fora que trabalhar sob qualquer tipo de contrato governamental abre caminho para muitas regras e regulações".

8. O nome de projeto do 2600 veio de uma bicicleta

Stella de Joe Decuir
Stella, ao contrário de codinomes inspirados em secretárias da Atari, era uma "magrela"...

Era prática comum da Atari na época que seus produtos em fase de desenvolvimento tivessem codinomes, e esses codinomes eram nomes de mulher. A ideia nasceu com o engenheiro Jay Miner, um dos principais designers de circuitos integrados do Atari 2600, e que mais tarde fundaria com outros ex-funcionários da empresa a Amiga — ganhando sua alcunha mais conhecida, o "Pai do Amiga".

Entre as moças/projetos da Atari, estavam Pam (Atari 5200), Candy (Atari 400), Colleen (Atari 800), Cindy (Atari 2800) e a mais famosa de todas, Stella (Atari 2600). O nome é de mulher, mas não foi nenhuma moça que encantou o autor do projeto ou algo assim... Era a bicicleta do engenheiro Joe Decuir, cuja marca de uma tradicionalíssima fabricante francesa era visível no cano — essa aí da imagem que ele mesmo divulgou anos atrás.

Era comum que funcionários fossem trabalhar de bicicleta, prática comum até hoje no Vale do Silício: segundo relatório do Google, cerca de 10% dos empregados que residem próximos à sede escolheram a bicicleta naturalmente.

Outros nomes vieram de secretárias da Atari, mas curiosamente foi a "magrela" quem deu nome ao sucesso maior.

7. Um produto ligado à Atari deu à luz o AOL

America Online
No início da popularização da Internet, o provedor AOL foi um gigante.

No começo dos anos 80, um serviço de distribuição de games via conexão discada foi criado para o Atari 2600, o GameLine. Operado e controlado pela Control Video Corporation, permitia que assinantes donos de um 2600 pagassem uma pequena taxa para baixar jogos que funcionavam determinado de vezes. Depois era preciso acessar de novo, renovar a taxa, etc.

O serviço seria primeiro oferecido a empresas de música, notícias e bancos, mas problemas legais fizeram o criador, William von Meister, refazê-lo para distribuir games. O módulo principal, um modem, parecia um grande cartucho de Atari com uma conexão padrão RJ11 (veja aqui).

A empresa quebrou durante o crash de 1983, mas de suas cinzas nasceu a Quantum Computer Services, que criou o Quantum Link, com a gama maior de serviços planejados inicialmente, mas agora para Commodore 64 e 128. Mais tarde, a QCS viraria America Online — uma das primeiras gigantes na era da Internet.

6. A Atari (involuntariamente) queimou o filme dos games er0ticos

XMan Atari ad
X-Man teve algum sucesso aqui, mas nos EUA foi boicotado por causa do escândalo da Mystique.

O segmento er0tico (estou trocando as letras para evitar certos filtros) sempre foi uma potência em qualquer mídia. Na literatura, cinema, teatro, sempre a força sexual teve e terá seu espaço. No começo dos games, então, quem ousaria decretar o fracasso do nicho?

Mas quem deu uma bela barrada nessa linha de diversão foi a Atari. Involuntariamente. Como as desenvolvedoras não-licenciadas eram muitas e faziam gato e sapato do 2600, eles não conseguiam controlar as produções (tal como a Nintendo conseguiu anos depois), e foi assim, sem seu aval, que veio a famigerada linha de jogos da Mystique, união de uma pequena softhouse com uma produtora de filmes adultos.

Especialmente Custer's Revenge, em que o jogador podia violentar uma indígena amarrada, foi alvo (com toda razão) de protestos de grupos feministas, nativos americanos e anti-porn0grafia. As produções da Mystique eram de péssima qualidade, com jogabilidade quase inexistente e apostando na apelação pura pra vender. Sua repercussão negativa tornou o tema, como se não fosse tabu o bastante, em algo virtualmente proibido no mundinho dos games.

Outras empresas tentaram, como a Universal Gamex de Alan Roberts (cineasta com currículo de filmes de baixo orçamento e softp0rns como Young Lady Chatterley, seu maior sucesso), que lançou X-Man — assim mesmo, com A — programado por H. K. Poon. Não perdia para games medíocres de labirinto de sua geração, e embora houvesse interesse do público, lojistas temiam colocá-lo nas prateleiras.

Segundo Roberts, em entrevista da época, "A resposta dos jogadores foi entusiástica, homens e mulheres, e esperávamos negócios excelentes, mas foram atrapalhadas pela linha da Mystique e a péssima recepção da mídia". Em julho/1983 circulou em revistas gringas um anúncio de página inteira para venda do game pelo correio. Era uma alternativa ao boicote, mas parece que não bastou.

Muito por culpa dessa carga histórica, consoles negligenciaram o segmento e até hoje, mesmo com um público de predomínio adulto, jamais foi lançado algo remotamente similar — em alcance mainstream — aos games er0ticos do 2600 (fora regionais como os da Illusion ou produções independentes).

5. A Activision nasceu de dentro da Atari

David Crane
David Crane foi um dos que vazaram da Atari para fazer sucesso fora, descontente com o tratamento que davam aos talentos da casa.

A mui estimada super-desenvolvedora Activision, dona ou metida em alguns clássicos modernos como CoD, Destiny, Tony Hawk's e Guitar Hero, praticamente se criou dentro da Atari, e pior: graças a uma política muito sacana da casa.

No começo do sucesso, a Atari tinha uma baita equipe, lançando dezenas de títulos, mas não dava créditos a nenhum. Nomes de engenheiros, designers e roteiristas eram praticamente secretos, não apareciam em parte alguma do jogo e nem manuais e impressos. Havia uma regra de quase sigilo total sobre identidades — ninguém teria reconhecimento público trabalhando lá.

Isso causava descontentamento na equipe, lógico. Chegou a tal ponto que alguns se rebelaram e resolveram peitar a direção, na figura do então CEO, Ray Kassar, exigindo que recebessem direitos autorais, além de melhor exposição como autores. Não só levaram um grande NÃO, como ainda ouviram que "qualquer um pode produzir um cartucho".

Resultado: três saíram fora imediatamente, fundando uma companhia própria, a Activision. Esses primeiros foram David Crane, Alan Miller e Bob Whitehead, logo seguidos por Larry Kaplan. A empreitada, ironicamente, rendeu uma das maiores fontes de excelentes jogos para o 2600, pérolas como Enduro e Pitfall!.

A equipe levou consigo e reaproveitou ideias dos tempos de Atari: Dragster, de Crane, foi baseado no arcade Drag Race, e Kaboom, de Kaplan, no arcade Avalanche.

4. O Evangelho Segundo St. Pong?

Hoje não sei se ainda está em uso, mas empresas costumavam ter um boletim interno, aquela coisa padrão: algumas informações úteis, piadas, um lance pra descontrair e ao mesmo tempo fazer comunicados ao time. O boletim da Atari não era diferente, exceto pelo nome. Foi batizado "O Evangelho Segundo St. Pong — Fundado a Serviço da Família Atari". Claramente uma sátira, homenagem, ou como queira chamar, aos informativos religiosos.

Os funcionários eram chamados de "atarianos", tinha classificados, calendário de aniversários e até receitas. O título, que hoje daria uma confusão danada né?, foi escolhido num concurso entre 54 opções. O vencedor foi Dennis Flinn, do setor comercial, que ganhou uma TV Hitachi.

Você pode ver a edição do boletim com data de 25/07/1973 aqui (cortesia de Atari Archive).

3. Bushnell "trocou" a Atari por um terreno - e depois o perdeu

bushnell and nancy by chris gardner
Nancy e Nolan: o casal perdeu praticamente tudo depois do fracasso do Androbot. Foto: Chris Gardner

Seria uma boa manchete sensacionalista, hein? "Empresário troca empresa por terreno!", mas não é bem isso. Bushnell vendeu a Atari para a Warner Communications em 1976 por U$28 milhões; o dinheiro colocado pela Warner foi vital para transformar o projeto Stella em realidade, e mais tarde eles recuperariam o investimento centenas de vezes.

Mas claro que a porção pessoal dele não ficaria no caixa da empresa: com sua fração, Bushnell adquiriu um belo lote de terra em Woodside, na Califórnia, canto conhecido por ser morada de alguns dos maiores milionários e celebridades americanas e internacionais, como Michelle Pfeifer, Joan Baez e Neil Young. Ali teve uma magnífica casa.

Teve, porque uma de suas muitas empreitadas, a Androbot Inc. — companhia que venderia um tipo de robô misto de brinquedo educativo e assistente pessoal — foi um fracasso monumental, financiado pelo banco de investimentos Merryl Linch, que tascou-lhe um processo igualmente enorme e virulento. A ação arrastou-se por 15 anos, e no final, Bushnell perdeu praticamente tudo, incluindo a casa em Woodland, outra avaliada em US$8 milhões em Paris, além do afastamento de investidores e quase a ruína do casamento.

"Minha esposa disse que vai me deixar se eu tentar outra coisa com robôs", disse em referência a Nancy, com quem casou-se em 1977.

2. "Atari" foi o segundo nome da Atari

Gravado pra sempre como ícone da tecnologia e cultura, o nome Atari não foi o escolhido desde o princípio. Nolan Bushnell e Ted Dabney trabalharam em Computer Space — primeiro arcade comercial da história — que foi lançado pela Nutting Associates. Sem muito sucesso, talvez pela falta de intimidade do público com a novidade; o próprio Bushnell disse que os controles o faziam algo atraente para "nerds" e iniciados em tecnologia (ou seja, pouca gente no início dos anos 70).

Decidiram tentar algo novo e mais acessível, com ideias inspiradas no contemporâneo Pong. Fundaram uma nova companhia, chamada Syzygy Engineering.

HEIN? Syzygy? É um termo científico usado em astronomia, oceanografia e outros campos, mas para desenvolvedora de games, parecia meio assustador. Mais bizarro ainda é que ao tentar incorporar a empresa, descobriram que o nome já estava registrado na Califórnia: era uma produtora de velas para a comunidade hippie.

Obrigados a buscar outro nome, Bushnell encontrou no jogo de Go a inspiração. Ou melhor, pegou na cara de pau um dos termos do milenar tabuleiro: "atari" é a situação quando uma pedra tem apenas uma saída. Assim, em 27/06/1972, nasceu a "Atari".

Convenhamos que Atari é muito mais sonoro e internacional do que "Syzgiyyugungjnjf-seja-lá-o-que-for". Uma pequena jogada perfeita do destino.

1. Steve Jobs participou de Breakout e foi empregado da Atari

young-steve-jobs-and-wozniak
Steve Wozniak e Steve Jobs: a ligação dos dois remete aos tempos da Atari.

A única empresa em que Steve Jobs trabalhou (além de sua Apple, e um emprego de verão na Hewlett-Packard, quando conheceu Steve Wozniak) foi a Atari, no início dos anos 70. Nolan Bushnell queria uma versão para 1 jogador de Pong (um tal de Breakout, conhece?), usando o mínimo possível de componentes. Jobs foi incumbido pelo projeto como uma espécie de "teste de admissão". O pagamento seria de US$750 + bônus para cada chip usado a menos que 50. Jobs sendo Jobs, ainda rapazola, meteu a mala e prometeu entregar em 4 dias.

Como não manjava tanto de circuitos, mas sabia que Wozniak (ainda funcionário da Hewlett-Packard) era experiente, o convenceu a "ajudá-lo" prometendo dividir a grana se conseguisse reduzir os chips. O amigo ficou com a engenharia e Jobs com a placa de ensaio e testes. Viraram noites, mas o prazo foi cumprido, usando 44 chips. Wozniak recebeu US$350 — acreditou por anos que a Atari pagaria 700 dólares pelo design com menos de 50 chips, ou US$1 mil se tivesse menos de 40. Jobs? Marotamente manteve para si o bônus de 5 mil dólares.

Sua passagem foi breve, mas marcada pela personalidade. Segundo Bushnell, Jobs podia ser descrito como alguém "difícil mas de valor, quase sempre o cara mais esperto numa sala, e que gostava de deixar isso claro para os demais". Várias histórias circulam, como a que teria sido colocado no turno da noite porque andava descalço, seus papos "místicos-hipponga" e a mais conhecida, de feder pelos longos turnos que fazia.

"Ele cheirava mal? Sim, mas só porque o escritório não tinha chuveiros, isto é o que acontece depois de três dias sem tomar banho" — lembrou Bushnell na Campus Party Brasil de 2013.

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