Lá estava eu na loja de games — o ano talvez fosse 1992 — com meu Tennis Ace na mão. Por algum motivo que só a inquietação infantil explica ou não, queria porque queria me livrar daquele ótimo jogo.
Era o auge de Street Fighter II nos arcades, e depois de anos jogando Double Dragon e Pit Fighter, desejava uma luta no meu humilde Master System. Qualquer coisa servia.
E foi assim que, revirando os cartuchos de troca da loja, encontrei Vigilante. Não tinha ideia do que era, mas pelo título, parecia tiro ou luta. Confirmada a suspeita, voltei pra casa sem o Tennis Ace (e uns cruzeiros) e com Vigilante no bolso.
Num tempo de poucas opções de luta decentes no Master System, Vigilante vinha a calhar. O que mais tinha de bom em beat 'em up? Que fosse porrada mesmo, não hack and slash? Double Dragon, Black Belt e...
Pois é. Talvez tenha sido o que a Sega pensou em 1988 ao reprogramar o port de um arcade da Irem — mesma dos clássicos R-Type e Moon Patrol. Conseguiram um trabalho digno para a carência de seu acervo, mas Vigilante não era exatamente uma fonte muito rica...
Enredo e jogabilidade
A Maria se deu mal
Vigilante tem uma história simples e clichê total: mocinha em perigo, gangues, um justiceiro porradeiro no resgate quebrando a cara de todo mundo até salvar Maria, a donzela em apuros. Quase um Ctrl C+ Ctrl V da trama de Double Dragon, lançado pouco antes. Não espere nada muito criativo nesse aspecto.
As semelhanças com Double Dragon não vão além. Herdeiro espiritual de Kung-Fu Master, da mesma Irem, Vigilante restringe seus movimentos. A progressão é sempre lateral e linear; o jogador pode voltar a qualquer parte da fase desde que ainda não tenha enfrentado os chefes. Não serve de nada a não ser que pretenda enfrentar uma horda de oponentes que aparece de forma contínua até o tempo da fase acabar.
No geral, há uma boa variedade de inimigos para um jogo de console 8-bit. Os mais comuns são os Chokeholders, carinhas que tentam enforcá-lo. Além de perder energia caso não se livre deles, seu lutador fica imobilizado, permitindo que caras bem mais perigosos se aproximem e desçam o cacete com nunchakus, correntes e porretes. O meliante com a faca pode matá-lo rapidinho. Até arma de fogo aparece de vez em quando.
Os Chokeholders são ligeiros, obrigando o jogador a tomar decisões rápidas. Livre-se deles logo ou começam a se acumular e aí a coisa fica feia. Felizmente não é preciso derrubar todos: eles passam correndo e se você saltar, seguirão direto até sair do outro lado da tela. Estranho.
Na terceira fase, bandidos com motos aparecem. Cada uma das cinco fases reserva um chefe, sendo o último o Giant Defiant, que de gigante não tem muito. Inimigos surgem o tempo todo, pela frente e por trás — às vezes também saem de portas ou saltam de partes altas da tela. Os chefes têm movimentos únicos, como o gordão punk da segunda fase, capaz de voadoras muito rápidas.
Saltar, saltar...
O salto é mais importante que em outros jogos. Não que a voadora seja boa, pelo contrário. Os controles é que não ajudam e fica mais fácil fugir da luta do que derrubar todo mundo. Ao acionar o botão de soco ou chute, há um atraso minimo até desferir o golpe, suficiente para obrigá-lo a aprender o timing. Se for sua primeira partida, o vigilante será enforcado e espancado até a morte, provavelmente.
Correr também é uma opção. Quando vir um cara loiro tipo Guile de faca na mão, não tenha vergonha em meter o pé na estrada e deixá-lo falando sozinho.
A voadora é terrível de acertar e mesmo chutes básicos como a rasteira têm uma área de acerto que exige prática. A detecção de acerto de Vigilante é horrenda; você pode dar vários socos para acertar alguns quando as coisas ficam turbulentas. Ou ficar abaixado socando um chefe à uma distância completamente absurda — e acertando.
Ao fim de cada fase há uma pequena cutscene precedida por uma animação do personagem. Na segunda fase, por exemplo, ele quase resgata Maria, mas os bandidos escapam numa van. Nas fases seguintes, o vigilante entra num elevador, etc. As cenas contam de modo bem superficial o que está acontecendo. Essa narrativa, ainda que não seja grande coisa, acrescenta pra quem gosta de ter uma história sendo contada.
Há poucos itens no jogo, sendo só algumas armas como um nunchaku e uma corrente. Elas ajudam uma barbaridade, aumentando demais sua área de alcance. E preserve sua energia para o chefe da fase porque simplesmente não há power-ups ou formas de recuperar energia.
Vários nomes do arcade foram alterados na versão Master System, ficando mais "soft". Além do Giant Devil que virou Defiant, a gangue que sequestra Maria eram Skinheads no original; no console, viraram Rogues. O chefe da terceira fase do arcade, Skinhead The Terrible, virou Macehead The Horrible.
A dificuldade de Vigilante não é das maiores. Quando se acostumar à rotina dos inimigos, o jogo fica fácil ao ponto de ser terminado em minutos. Há um desequilíbrio enorme no uso das armas, e se não perdê-las, as fases serão como um passeio.
Gráficos e som
Os gráficos são a melhor parte de Vigilante. Personagens são grandes, com boa animação — repare no herói dando socos com punhos alternados. Cada detalhe é bem reconhecível, como roupas e penteados dos membros da gangue, enquanto cenários transmitem a atmosfera de cidade violenta e caótica, aquela coisa Nova Iorque dos anos 80.
Alguns são especialmente bonitos, como o final do ferro velho com um céu colorido, elementos de primeiro plano e a van móvel. Outros não empolgam, como a quarta fase, que além de curta é dominada por padrões simples. A fase final é numa construção e incluíram até uma animação inútil do personagem se pendurando na armação. No geral, Vigilante é um jogo visualmente agradável.
Como outros do console (Black Belt, Double Dragon, Kenseiden, etc), a barra de energia em Vigilante fica sobre um fundo preto. Poucos games do Master System conseguiram escapar disso, como Golden Axe. Mas nesse caso vale um desconto, afinal o original do arcade já era assim.
A música não é das piores. Fizeram uma conversão bem fiel, com faixas curtinhas de melodia pegajosa. Vão ficar na sua cabeça — lembrava delas antes mesmo de jogar para escrever esse review. Já efeitos sonoros são básicos ao extremo, econômicos. Com exceção de um som de soco, um efeito de explosão e outro aqui e ali, não tem nada que contribua para empolgar a partida.
Sorte de quem tem um Master System japonês: Vigilante é um dos jogos que usam o chip de som FM. Ele melhora consideravelmente a qualidade das músicas.
Conclusão
Vigilante não é daqueles jogos que entram para seleções de melhores de um sistema. Também vale para a versão Master System: é um passatempo descartável. Era interessante lá no passado, quando donos de Master System não tinham acesso a coisa melhor, jogando num aparelho de terceira geração. Hoje Vigilante é nostálgico para quem passou horas da infância nele. Sem esse valor, não sobra muito.
Se ainda assim quiser conhecer porque sei lá, gosta de experimentar jogos antigos?, boa sorte. Prepare-se para enfrentar controles pouco responsivos, detecção de acertos problemática num jogo linear, curto, e em que depois de aprendidos os padrões, torna-se previsível. Após terminá-lo algumas vezes, não haverá absolutamente nada em Vigilante para pedir um replay. Exceto nostalgia.
E pensar que perdi meu Tennis Ace...
Concordo perfeitamente com tudo o que foi dito, enredo aceitável para a época em que foi desenvolvido, gráficos dignos, som adeqado para o poder do master system.
Mas a jogabilidade é tão irritante, que não se consegue desfrutar do game.
Clássico...cheguei a jogar a versão arcade, bons tempos!!!! feliz 2020 para todos!!!! valeu
Feliz ano novo!