A história do Sega Saturn – parte 3

Este artigo é parte de uma série. Comece pela primeira parte.

Lançamento e recepção

Saturn na América

Campanha americana do Saturn, que também teve o rapper Ice Cube usando os anéis.

A tensão entre casas da Sega crescia quando, após ignorar as sugestões americanas, Nakayama encerrou o Mega Drive globalmente. O 16-bit fracassara na terra natal, e a decisão fazia sentido ali, mas não no resto do mundo. A sensação era que o Saturn estava sendo empurrado nas goelas de todos.

Em março de 1995, um resignado Kalinske preparou a campanha de lançamento. Manteria a estratégia de eventos espalhafatosos, como em Sonic 2 do Genesis — o Sonic 2sday, que marcou para sempre o mercado. A data do Saturn seria o Saturnday, obviamente um sábado, 02/09/1995.

A expectativa japonesa era vender 1 milhão de unidades na América até abril, e 2 milhões ao longo de 1996. Mas a Sony anunciou o PlayStation para 09/09, o que de novo, engatilhou uma reação emergencial e desastrosa da Sega. Atropelando a programação, Nakayama ordenou que o Saturn fosse antecipado, querendo ganhar o público impaciente ou indeciso.

Kalinske discordava. Certo, pensava ele, era investir no Genesis enquanto preparavam o Saturn para chegar com tudo. A Sega ainda tinha quase 43% de participação com o 16-bit, e para o executivo, venderiam talvez "mais 300 mil Genesis" até o fim de 1994.

Mas restava acatar. Mais tarde, refletiria:

Senti que estávamos precipitando o Saturn. Não tínhamos o software nem o preço certos, então senti que poderíamos ter ficado com o Genesis por mais um ano. Reconheço que nossos volumes teriam caído, mas acho que teríamos uma empresa muito mais saudável. Teríamos mais lucro, e acho que o pessoal que aprecia videogames gostaria que ficássemos fazendo um monte de grandes produtos no hardware 16-bit.

Desastre

Em 11/05, o Saturn foi anunciado na E3 1995. Para surpresa geral, com lançamento imediato, ao preço de 399 dólares, e acompanhado de Virtua Fighter. Além dele, havia 5 jogos disponíveis, e nenhum de terceiros: Panzer Dragoon, Clockwork Knight, Pebble Beach Golf Links, Daytona USA e Worldwide Soccer.

Precipitado em quase seis meses, não havia estoque para abastecer todos os distribuidores. Kalinske teve que se virar para justificar o injustificável. Disse que "devido à grande demanda" e alguns consumidores importando o Saturn por valores absurdos como US$800, a Sega enviaria 30 mil unidades a redes selecionadas: Toys 'R' Us, Babbage's, Electronics Boutique e Software Etc.

Desculpa furada que causou profundo desconforto nas lojas preteridas. Não quaisquer lojas, mas megarredes como Walmart e Best Buy. A KB Toys, que ficava em shoppings, anunciou em retaliação que retiraria a Sega de seu catálogo. Mesmo entre as beneficiadas, a quantidade às vezes era tão baixa que clientes não conseguiam o Saturn, que sumia rapidamente.

O relato de Levi Buchanan, jornalista de games, explica esse sumiço:

Tive uma experiência em primeira mão no lançamento do Saturn. Eu trabalhava numa Software Etc num shopping quando a Sega fez o anúncio. E logo, em questão de horas, chegaram algumas caixas da Sega à nossa loja. A primeira tinha só quatro Saturns. A segunda era só de software, e havia mais cópias de cada jogo do que consoles que tínhamos em mãos. Acho que tinha seis ou sete cópias de Daytona USA.

Naturalmente, estávamos empolgados. E adivinhe? Nem um Saturn sequer foi às prateleiras. Nós funcionários compramos todas as unidades, então quando consumidores souberam do lançamento surpresa, só havia games disponíveis para venda. Soa babaquice hoje, mas isso foi na era antes da explosão da internet, e pensamos que as lojas teriam reposição em alguns dias. Mas não aconteceu. Não recebemos Saturns adicionais por mais de um mês.

E aí, enfim, os clientes simplesmente pararam de perguntar. Não sei se a Toys 'R' Us na mesma rua recebeu unidades adicionais além das que teve no lançamento, e se é para lá que nossos clientes — nossos leais clientes — foram. Ou se só deixaram de se importar.

Na mesma E3, o PlayStation também iria ao palco. Quando o presidente da Sony CEA anunciou o preço — 299 dólares —, o público foi ao delírio.

Era 100 dólares mais barato que o Saturn.

Caos diretivo

Enquanto a Sony mimava público e desenvolvedores, a Sega vivia um inferno diretivo. Japão e América batiam cabeça. O comando atropelava opiniões de fora, tratando escolhas locais como verdade universal.

Tal como a Sega antes, a Sony direcionou seu marketing a um público maduro. Mas ao contrário daqueles, não miraram o pré-adolescente que abraçou o Genesis porque já não se identificava com princesinhas ou o bichinhos fofinhos. Queriam uma faixa independente, capaz de escolher o que consome, ávida pelo novo. Menos seduzível por promessas do distante Nintendo 64, e que não esperaria a Sega limpar a própria bagunça.

Por algum tempo, mantiveram a meia-verdade de que o PlayStation gerava entre 500 mil e 1 milhão de polígonos. Número exagerado em situações reais, não passava de 360 mil sem efeitos. Fizeram seleção de qualidade dos jogos aceitos, buscando exibir ao máximo esse potencial. Na figura de Bernie Stolar (vice-presidente da Sony CEA), barravam até RPGs, alegando que o gênero não explorava bem a capacidade tridimensional. A meta era criar o mito do PlayStation Supermáquina 3D. E naquele momento, funcionou.

Como na geração anterior, a Sega optou por campanhas orientadas ao público adolescente. Mas a Sony também estava de olho nesse consumidor.

A Sega, com campanha de 50 milhões de dólares, seguiu sua pescaria pelo público adolescente. Num dos mais famosos, uma modelo nua está coberta por telas de jogos do Saturn. A legenda diz "Caso não tenha notado, há uma linda mulher nua nesta página", e no rodapé "Quando você tem o triplo poder de processamento do Sega Saturn, nada mais importa". A revista EGM nomeou a campanha como melhor de 1997 em seu guia de compras.

Algumas apelaram ao ataque direto, tática antiga e funcional na quarta geração. Rivais ganharam apelidos sarcásticos: a Nintendo é citada como "Pretendo", e o PlayStation virou "PlayThing". O promocional de NiGHTS dizia que o concorrente não podia ter a mesma qualidade por causa de sua CPU simples. No final, mostra PlayStation sendo jogado de um prédio. Enquanto cai, o narrador diz "Voe, PlayThing, voe... Você não está pronto".

Em outro, já em 1996, a Sega mirou o Nintendo 64, prestes a ser lançado. O videogame era usado para tiro enquanto narrador dizia "Encare isso, Pretendo: não vale a pena esperar por você".

Terror dos programadores

O Saturn era bem mais difícil de programar. Poucas softhouses mostraram interesse, tempo ou capacidade técnica para lidar com o complexo hardware da Sega. Algumas importantes se aliaram à rival. Entre elas a Square, que abandonou a Nintendo e sua insistência em cartuchos no Nintendo 64.

Já a Core Design, parceira em títulos como Wolfchild e Chuck Rock, fez Tomb Raider sair primeiro para o Saturn na Europa (apesar de desenvolvido com o PlayStation como prioridade). A estreia de Lara Croft impressionou até o STI. "Vimos Tomb Raider como protótipo quando a Core ou a Eidos enviou aquilo ao STI para que déssemos nossa opinião sobre a jogabilidade, e se teríamos interesse", lembrou Don Goddard. "A demo nos ARRASAVA; animação e movimentos do personagem realmente fantásticos para a época, sem falar do 'som locacional', em que a música soava diferente dependendo do lugar".

Com a pressa, sequer houve um bom kit de desenvolvimento no lançamento. O único disponível era da Sophia Systems, o chamado SegaSaturn Programming Box. O cenário era o pior possível: tecnologia nova, hardware complexo, programadores sem documentação ou ferramentas adequadas.

A Sega entendia a transição complicada, mais ainda pela estrutura intrincada do Saturn. Tentaram ajudar os profissionais criando ferramentas próprias. Quando o Saturn CartDev foi disponibilizado, não oferecia muito e era pouco confiável. Programadores tinham que ser virar com hacks para alcançar o que pretendiam.

Também ofereceram treinamento, como explicou Miller:

Tínhamos um time completo, um grupo dedicado de pessoas que faziam conferências caras de produzir. Elas tomavam muito tempo, e mesmo nossos desenvolvedores sênior, que estavam escrevendo código para títulos first-party da Sega da América, eram solicitados a criar apresentações para as conferências de desenvolvedores, compartilhar seu conhecimento do trabalho no hardware, para que aquilo aproximasse third-parties o mais rápido possível.

O CartDev Rev B foi o kit que tornou mais acessível programar para o Saturn. Imagem: Rig_Veda.

Depois viria o CartDev Rev. B, pela Cross Products. Ele trazia um Saturn levemente modificado junto, chamado de Dev-Saturn, conectado ao kit por um buffer card. O programador podia realizar debug e testes ligado a um computador padrão em vez de precisar de um In-Circuit Emulator para emular o processador da Hitachi (para o Saturn, havia o modelo E7000). Se o desenvolvedor já tivesse o Programming Box, poderia usá-lo em vez do Saturn do pacote. O investimento ficou bem mais baixo.

Ao mesmo tempo, a Sega soltou softwares para Windows e Mac, como as Sega Graphics Library (SGL) feitas por Tadahiro Kawamura. Era um conjunto de ferramentas para simplificar tarefas no design 3D. Soltaram também recursos para vídeo (Cinepak) e áudio.

Ainda em 1995, seria lançado um kit feito pela Psygnosis, chamado Psy-Q.

Início claudicante

Nos quase quatro meses entre o lançamento antecipado e a data original, o Saturn vendeu ridículas 80 mil unidades nos Estados Unidos. A Sony vendeu mais de 100 mil Playstations no primeiro dia. No Japão, foram 200 mil unidades do Saturn no primeiro dia.

Poucos jogos saíram no primeiro ano, incluindo Astal e Virtua Fighter Remix em abril, Gex e Virtua Cop em novembro, e Fifa 1996 em dezembro. Depois alguns ports de arcades System 32, e das Model 1 e 2, junto a títulos de terceiros como Street Fighter Zero, The King of Fighters, X-Men e Metal Slug.

Seiichi Ishii, aos 24 anos, quando começou na Namco. Foto: 4Gamer.

Além da vantagem com a conversão mais fiel de Ridge Racer, a Namco também bateu de frente com Virtua Fighter. Um dos designers da Sega naquele início de geração, Seiichi Ishii (importante em Virtua Fighter e Virtua Racing) foi contratado pela Namco e os ajudou a criar uma evolução da luta 3D.

O resultado foi Tekken, portado do hardware System 11 para o PlayStation em agosto de 1995, com extrema qualidade. Tornou-se o primeiro jogo a vender mais de um milhão de cópias na plataforma sonysta.

Dois meses depois, a Sega contra-atacava. Anunciaram Virtua Fighter 2 para dezembro, e reduziram o preço do Saturn para 299 dólares.

Parceria com a Nvidia

Em julho de 1995, foi anunciado o suporte da Sega ao chip NV1, da então novata Nvdia. "O NV1 foi um dos mais avançados e integrados processadores multimídia de seu tempo", disse Michael Hara, ex-executivo de marketing da empresa. "Sob uma única arquitetura, ele fornecia emulação VGA e SoundBlaster, full-motion video e gráficos 3D, tudo possível com 1MB de frame buffer".

Memórias na época eram muito caras — segundo Hara, 1MB de VRAM custava cerca de US$40. Para uma resolução 1024 x 768 px, era preciso mais que isso. A Nvidia optou por uma arquitetura econômica, similar a do Saturn e também do 3DO: polígonos quadriláteros.

"Usando polígonos quadriláteros texturizados", disse Hara, "você podia renderizar a textura de um lado a outro e simplesmente empurrá-las direto pelo frame buffer, assim requerendo menos memória".

Versões de jogos da Sega foram portados do Saturn para o chip NV1 (placa Diamond Edge 3D). Imagem: VGMuseum.

A Sega levaria a qualidade de seus arcades 3D para PC num futuro próximo. Para a Nvidia, o início dos sonhos: chegar ao PC convertendo títulos da Sega. "As arquiteturas da Sega e do NV1 compartilhavam algo chave: ambos pipelines de renderização usavam padrões quadriláteros. Então, no começo, jogos da Sega eram facilmente portados para o NV1", explicou Hara. "Quando o NV1 foi lançado, vinha no pacote com Virtua Fighter e Virtua Racing*. Grande negócio".

* Possivelmente Hara foi traído pela memória, já que Virtua Racing não foi convertido para a NV1. Os jogos compatíveis foram Battle Arena Toshinden, Descent: Destination Saturn, NASCAR Racing, Panzer Dragoon, Virtua Fighter Remix e Virtua Cop. O pacote tinha Virtua Fighter Remix e NASCAR.

Ainda segundo Hara, Suzuki supervisionou a parceria. "Yu Suzuki designou um time para a Nvidia para converter os jogos. Tudo tinha que passar pelo crivo de Yu". A placa Diamond Edge 3D começou a ser vendida em novembro.

Saturn 2 e guerra de preços

Entre novembro e dezembro de 1995, houve melhora na distribuição do Saturn, e a falta de estoque foi resolvida. O console com Virtua Fighter Remix era vendido por 349 dólares; a embalagem tradicional caiu para 299, preço que Kalinske queria no lançamento. Jogos de terceiros como Electronic Arts, Acclaim, Crystal Dynamics e Time Warner Interactive respondiam pela maior parte da venda de software. Exclusivos como Virtua Fighter 2, Virtua Cop e Sega Rally também iam bem — em dezembro de 1995, 200 mil cópias da sequência de luta foram comercializadas.

A Sega previa que a dura competição com o PlayStation ficaria pior com a volta da Nintendo no ano seguinte. Em novembro, o mercado já especulava os problemas que o Ultra 64 traria à Sega. Circulava a notícia de que a resposta viria com um Saturn "melhorado". Tal console estaria em desenvolvimento com a Lockheed Martin desde setembro de 1994. Ou seja, antes mesmo do Saturn sair no Japão.

Se produzido, o upgrade do Saturn teria a tecnologia da Lockheed Martin, com gráficos parecidos com os prints do anúncio...

Da revista Next Generation, novembro de 1995:

Acredita-se que esta máquina de segunda geração estará disponível aos desenvolvedores no fim do ano que vem [...] a maré de desapontamento de desenvolvedores e equipe interna com carências básicas e dificuldades na arquitetura do Saturn forçaram a Sega a adotar uma estratégia que resultará na máquina original (que nem chegou a um ano) recebendo prematuramente um upgrade ou talvez até saindo de cena.

Ainda não se sabia o formato do tal "upgrade". Até o fim de 1995, falava-se num console novo, sem descartar a chance da Sega economizar fazendo um acessório com o Saturn como base. A Lockheed Martin cuidaria do visual no Saturn 2, fornecendo o chip R3D/100, com processadores geométrico e gráfico. Rumores diziam que Yu Suzuki e outros cabeças do arcade da Sega queriam que a LM abarcasse o projeto.

Se produzido, o console ou acessório teria poder teórico superior à Model 2. As especificações seriam similares ao cancelado M2, da 3DO. Mas a ideia foi vetada por causa de atrasos da LM no desenvolvimento do chip da Model 3.

Para o ano novo, a Sega da América relatava grandes planos. "Agora temos os elementos — o preço de 299 dólares para o sistema, excepcional software nas lojas, e uma fila de softwares para 1996 que nenhuma companhia pode igualar — para reconquistar a liderança da próxima geração na América do Norte em 1996", disse Kalinske no fim de 1995.

O modelo redesenhado do Saturn, com botões arredondados. Na América, foi lançado na cor cinza. No Japão, predominou o modelo branco.

Três vezes mais Saturns foram enviados às lojas do que nos meses anteriores. O número de usuários saltou para 400 mil na América, e 2,2 milhões no mundo. Mas em dezembro, o calculava-se que sete meses de vendas da Sega equivaliam à metade das vendas do PlayStation em três. A proporção era 2:1 ou 3:1 contra. A explicação oficial para a disparidade era falta de material para fabricação de circuitos integrados, e a Sega priorizando o mercado japonês.

Em março, o preço caiu para 249 dólares. Veio o redesign do Saturn, com redução do preço no Japão. Durante a E3, em maio, a Sony baixou o PlayStation para 199 dólares nos Estados Unidos. A Sega prontamente anunciou que faria o mesmo ao lançar o Saturn redesenhado, apesar de seu custo mais elevado de produção. Nada resolveu, e na metade do ano, o Saturn seguia com metade das vendas do PlayStation. Àquela altura, a disputa estava em 600 mil x 1,2 milhões.

O Saturn apanhava a olhos vistos, e comandos autoritários do Japão desgastavam o time americano. "Não foi a falha do Saturn que fez ele [Kalinske] perder interesse, foi a inabilidade de fazer algo sobre aquilo. Ele não teve permissão de fazer nada", disse Michael Latham. "O lado americano basicamente não estava mais no controle".

Latham, produtor do fighting game do Mega Drive, Eternal Champions, também sentiu a mão controladora da Sega do Japão. A matriz vetou sequências além da lançada para Sega CD, determinando que o foco estivesse em Virtua Fighter.

Na metade do ano, dava-se como certo que a Sega faria mudanças no escritório americano em breve. O nome de Stolar, da Sony, era sondado para trocar de lado.

O fator Sonic

Sonic the Hedgehog foi um divisor de águas no Mega Drive. Logo, o mínimo que esperava-se no Saturn era que a Sega trouxesse de volta o mascote.

Uma das possíveis versões de Sonic X-Treme: consecutivas falhas e atrasos levaram o jogo ao cancelamento.

Sonic X-Treme seria a bola da vez no console, mas passou por quase incontáveis problemas. Primeiro, e talvez mais importante, a falta de planejamento adequado. O game nasceu como um conceito para o Mega Drive; com a chegada de plataformas modernas, foi para o 32X, até enfim chegar ao Saturn. Muito tempo de desenvolvimento foi perdido nessas transições.

Mas as dificuldades não foram só técnicas, como engines inadequadas e trocas de sistema. A colaboração entre divisões não funcionava. O Sega Technical Institute, responsável pelo projeto, era constantemente cobrado por coisas difíceis de obter. "Mostrávamos qualquer coisa e imediatamente começavam a perguntar 'onde estão os anéis e o que você coleta?', 'não tem os loopings?', 'quanto rápido podemos ir?'. Estávamos pegando um sidescroller 2D e indo para o total 3D, e queriam textura com correção de perspectiva e tudo a 60 FPS. Era pura insanidade!", lembrou Goddard.

Após quase incontáveis problemas, Sonic X-Treme foi cancelado. O original do ouriço azul no Saturn acabou sendo Sonic R, a Sega arranjou outra franquia como carro-chefe: NiGHTS into Dreams... O game de ação de Yuji Naka foi feito pelo Sonic Team nos Estados Unidos. Junto lançaram um novo modelo de controle chamado Saturn 3D Controller, com um analógico que tornaria a experiência melhor.

Nintendo na briga

Até o início de 1996, a Sega manteve cerca de 38% do mercado americano, contra 24 da galopante Sony e 30 da Nintendo, última a entrar na briga da geração. Mas o domínio da Sega estava com os dias contados, vinculado à perda de relevância da quarta geração. Com o passeio que a Sony ensaiava, a Nintendo parecia a única capaz de, quem sabe, impedir um futuro domínio absoluto do PlayStation.

O Nintendo 64, mantido em relativo sigilo até pouco antes do lançamento, foi recebido com quase histeria por público e imprensa. O jornal Los Angeles Times elogiou até a aparência resistente, dita "feito para durar na mão de crianças" contra o "relativamente frágil Sega Saturn". A revista Time o nomeou Aparelho do Ano e disse, numa empolgação colossal e precipitada*, que ele estava fazendo "pelos videogames o que o 707 fez pela aviação" — papel mais justo se dado ao NES, por exemplo.

* Lançado em 1957, o Boeing 707 mudou a história da aviação por carregar muito mais passageiros com menos combustível, fazendo assim percursos mais longos.

Em maio de 1996, a EGM noticiava o cancelamento de Eternal Champions: The Final Chapter. A sequência da série de luta, que começou no Mega Drive e passou pelo Sega CD, chegou a ter tela na caixa do Saturn americano, com a mensagem "em breve".

Mas a Sega do Japão não queria concorrência com Virtua Fighter. Palavras de Latham, produtor:

A Sega do Japão sentia que Eternal Champions evitava que Virtua Fighter fosse melhor sucedido nos Estados Unidos, e seria melhor para a companhia focar em apenas uma franquia... E sendo a Sega uma empresa japonesa, o lado do Japão venceu. Foi um golpe terrível, e a única vez em quase uma década trabalhando na Sega em que considerei sair. Fiquei principalmente com a esperança de mudar aquela decisão, mas infelizmente nunca aconteceu. Mesmo quando fizemos o projeto NetFighter para o Heat.net, não pudemos usar personagens de Eternal como bônus secreto. Pela perspectiva do Japão, o jogo nunca existiu, apesar das vendas astronômicas e até ofertas para a criação de quadrinhos e animações sobre ele.

Havia apenas 20 páginas de conceito quando Latham recebeu o aviso do cancelamento do Japão. Assim a Sega perdeu outra oportunidade de ter um killer app em território americano.

Saturn v08

Além do Saturn 2 em parceria com a Lockheed Martin, cancelado pelos atrasos na entrega da Model 3, outro projeto esteve em pauta. Até meados de 1996, a Sega trabalhou num upgrade do Saturn chamado internamente de Saturn V08. O fato não vazou na época, sendo conhecido a partir de meados dos anos 2000 através de entrevistas com antigos funcionários.

O V08 viria de uma joint venture entre Sega e Nvidia, explorando o chip sucessor do NV1 na forma de um console. "O NV2 estava sendo desenvolvido como a próxima geração do Saturn", explicou Hara. Esse Saturn V08, contudo, não foi adiante, tal como o próprio chip NV2.

Próxima parte: Stolar na Sega, cancelamentos, Bandai e o fim.

Daniel Lemes
Daniel Lemes
Fundador do MB, quase mil artigos publicados em dez anos pesquisando e escrevendo sobre games. Ex-seguista, fã de Smashing Pumpkins e Yu Suzuki.

Deixe seu comentário

Digite seu comentário!
Digite seu nome aqui

Mais recentes

Análises