Joe Miller foi um engenheiro e executivo americano, reconhecido por seu trabalho na Sega of America durante o auge do Sega Genesis.

Nascido em Columbus, Ohio, em 1954, Miller tinha três irmãs. Gostava de natação e de jogar tênis, mas logo demonstrou interesse por tecnologia. Estudou engenharia na Purdue University, e se envolveu com o desenvolvimento de novas tecnologias logo depois da faculdade.

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Seu primeiro passo surgiu como pesquisador no Battelle Memorial Institute, onde produziu softwares gráficos e trabalhava no currículo de treinamento para desenvolvedores da rede educacional PLATO. Projetado pela Control Data Corporation em 1962, o PLATO (Lógica Programada para Operações de Ensino Automático) era um sistema de instrução assistida por computador (CAI) que oferecia mais de 200 mil horas de material didático – a maior coleção de software educacional disponível na época – como tutoriais para funcionários.

Uma de suas realizações mais notáveis ​​no Battelle foi a criação do Sistema de Planejamento de Lançamento Interativo da NASA, usado para agendar todas as atividades de missão e lançamento. Também fazia pesquisa de materiais para proteção de ônibus espaciais durante a reentrada na atmosfera. Miller era grande fã da NASA e tudo relacionado ao espaço, tendo um dia aspirado ser astronauta. Seu amor pelo espaço foi lembrado por Tom Kalinske, CEO da Sega of America, do tempo em que estiveram juntos na Sega:

Ele tinha o canal da NASA em seu escritório, 24 horas por dia. Adorava falar sobre o espaço e os ônibus, e todas as diferentes missões que enviamos lá. Ele leu sobre todos e sabia tudo sobre cada um deles.

Ainda em Battelle, Miller conheceu John Powers, cientista pesquisador sênior e outro nativo de Ohio, que compartilhou sua visão de um futuro brilhante para computadores domésticos. Eles desenvolveram uma forte amizade, e foi Powers quem convenceu Miller a se dedicar ao desenvolvimento do PLATO.

Miller e Powers deixaram a Battelle Memmorial em 1977 e fundaram a Authorship Resources Inc. Logo se juntaram a Ken Balthaser, homem com formação em radiodifusão, mas forte interesse em computadores. Balthaser trabalhava para uma pequena produtora de vídeo que também vendia equipamentos audiovisuais. Miller e Powers, contratados pela Warner Communications para construir um sistema de monitoramento para seu sistema de televisão a cabo Qube, foram à empresa comprar um monitor.

Conversando com o dono, a dupla mencionou que desenvolviam software; foram então contratados para criar um sistema operacional para um novo computador que ele apresentaria ao varejista Montgomery Ward.

A máquina usava cassetes de áudio como mídia. Balthaser convenceu Powers e Miller a contratá-lo para trabalhar com a parte de áudio. Juntos, fundaram a The Authorship Resource, Inc., e dali criaram o sistema operacional e quase 30 aplicativos para o CyberVision 2001 (nomeado pelo próprio Miller). Um dos primeiros computadores domésticos, foi comercializado pelo catálogo de pedidos via correio da Montgomery Ward por US$399.

Reunião em 1999 de John Powers, Ken Balthaser e Joe Miller. Foto: arquivo pessoal.

Miller lembrou como as coisas pareciam estar indo bem no começo:

O produto foi lançado e vendido nacionalmente pela Montgomery Ward em 1978. Tínhamos um pedido da Ward's para 10 mil unidades da configuração inicial e de um novo padrão (modelo 3001) foi lançado numa segunda rodada de pedidos de Wards. Também desenvolvemos um protótipo de modelo 4001, de aparência muito mais elegante, que incluiu uma adaptação estendida do BASIC em ROM de ponto flutuante de Ron Cenker. Esse modelo nunca foi fabricado em grande escala.

A forte concorrência de plataformas lançadas em 1978, como a Tandy Computer e a Atari VCS, prejudicou o crescimento inicial do Cybervision. Problemas de fabricação, falta de um departamento de eletrônica na Montgomery Ward e outros fatores também afetaram as vendas. A máquina não conseguiu pegar e logo foi descontinuada. Powers foipara o Vale do Silício, onde trabalharia para a Atari, enquanto Miller ficou em Columbus com a ARI por um tempo.

Atari

Enfim, Powers convenceu Miller a se juntar a ele na Atari (Balthaser também faria a transição). A empresa estava no auge e havia forte interesse em sua linha de computadores domésticos. O trabalho de Miller na Battille e sua experiência com a CyberVision fizeram dele uma opção perfeita. Como gerente do software do sistema operacional da Atari, Miller supervisionou o desenvolvimento de toda sua linha de produtos e periféricos de computador.

Entre suas realizações estava o trabalho num sistema operacional compatível com versões anteriores, para as linhas 600/800/1400/1450, bem como colaborando no emulador de terminal PLATO para o Atari 800. Como os terminais ​​para operar o PLATO eram caríssimos para usar (US$ 50 a hora), só grandes empresas podiam se dar ao luxo.

Conforme a tecnologia se expandia para universidades e corporações em todo o mundo, e computadores domésticos avançados, o emulador da Atari deu aos donos da série 800 acesso a e-mail, quadros de avisos, jogos interativos e muito mais por preços baixos como US$ 5 — quase duas décadas antes da Internet.

Epyx e Sega

Depois de deixar a Atari, Miller passou um tempo na Koala Technologies e na Convergent. Na Koala, trabalhou na criação de periféricos para computadores Apple, como o teclado Muppet Learning Keys.

Em outubro de 1987, Miller estava na desenvolvedora de jogos Epyx, fabricantes de clássicos como Jumpman e California Games. Ali foi responsável pelo desenvolvimento de produtos, em busca de inovação. Em 1989, abordou o designer Chris Crawford sobre um jogo com o tema ambientalismo, que seria lançado para o Dia da Terra em 1990. Embora desconfiasse de trabalhar em jogos licenciados, a confiança de Crawford em Miller o convenceu a prosseguir com o projeto. O resultado foi Battle for the Planet. Quando a Epyx foi forçada a abandonar o projeto devido a problemas financeiros, Crawford decidiu publicar o jogo por conta própria, e creditou Miller a fazer isso acontecer.

Miller trouxe Balthaser para direcionar o desenvolvimento de software interno, retomando a velha parceria da ARI e da Atari. Muitos desenvolvedores europeus da Epyx seriam contratados anos depois, quando Miller e Balthaser estavam na Sega. Lá, trabalharam nos primeiros jogos desenvolvidos e lançados pela Sega of America (SOA).

Balthaser sabia que teriam que convencer os desenvolvedores dos EUA a embarcar no novo console Genesis, e precisava de um fornecimento rápido de jogos para mostrar que a inscrição como licenciados valeria a pena. Ele se voltou aos desenvolvedores na Inglaterra e França, com quem trabalhara na Epyx, para fornecer software. O resultado foi Battle Tank da M-1 Abram (Realtime Games Software na Inglaterra) e Fantasia (Infogrammes na França).

Miller partiu da Epyx em setembro de 1989, e co-fundou a Tidemark Corporation, startup que fez softwares para DOS, Windows e Mac. Lá, atuou como vice-presidente e diretor técnico. Já muito experiente em programação e desenvolvimento, Miller estava ansioso para colocar suas habilidades em algo grande.

Sega

Em outubro de 1992, ingressou na Sega of America, que passava por uma reformulação. Como contaria:

Na verdade, prestei consultoria à Sega desde meados de 1991 até o início de 1992, para Ken Balthaser, ajudando-o a coordenar e organizar o estúdio interno de multimídia. Então, recrutei o diretor inicial do estúdio, Tom Reuterdahl, e me afastei para fazer outras coisas. Quando Ken decidiu deixar a Sega e se juntar ao novo empreendimento de seu filho, a Sega entrou em contato comigo, pois eu tinha um relacionamento recente, e me convidou para participar como vice-presidente sênior de desenvolvimento de produtos.

Aceitou o convite ao saber pelo ex-CEO da Sega of America, Tom Kalinske da liberdade criativa que teriam da Sega do Japão. Nessa função, Miller supervisionou o desenvolvimento de hardware da filial americana e ficou conhecido como "O Pai do 32X" ao assumir o projeto vindo do Japão. Teve também papel importante na revisão do fluxo de trabalho de desenvolvimento, com ênfase na documentação das etapas.

Foi responsável por todo o desenvolvimento interno, ou seja, excluindo o que fosse de terceiros ou trazido pronto do Japão. A meta eram games de apelo no mercado americano, como os de futebol americano (série Sega Sports), mas também localização de produções japonesas. Para tal, fazia muitas viagens com outros membros da equipe ao Japão, onde eram discutidos as melhores opções para localização:

Acabávamos pegando um subconjunto do que eles [japoneses] estavam desenvolvendo para localização e adaptação ao nosso mercado [...] Era um esforço muito colaborativo, certamente no período em que estive lá, durante reuniões que participei com a SoJ.

Isso inclui 42 títulos em 1992, e 50 em 1993 – fora hardware. Na fase Sega CD, foi gerente de relacionamento entre Sega e Digital Pictures, responsável por vários jogos em FMV. Foi também um dos responsáveis pela montagem de uma equipe de áudio, capaz de trilhas sonoras adequadas aos discos digitais.

"Tenho orgulho do fato de termos montado uma equipe para cuidar do áudio", lembrou Miller, "um time de áudio que produziu e rivalizou com qualquer um no ramo. Montamos um estúdio em São Francisco que foi considerado pela revista Billboard uma das melhores instalações de produção musical da costa oeste. A trilha de 'Ecco: Songs of Time' e muitos outros títulos vieram de lá".

Miller se destacou por estabelecer e manter relações profissionais duradouras. Além disso, o desejo de estar sempre na vanguarda das novas tecnologias favoreceu muitos dos que trabalharam com ele, como o produtor Christopher Bankston, que considerou Miller seu mentor. "Ele é um dos melhores executivos com quem já trabalhei até hoje", disse em entrevista de 2009. Bankston se juntaria mais tarde a Miller na Sega, onde produziria a linha TruVideo de jogos FMV para o Sega CD.

Alguns dos mais renomados produtores da década trabalharam sob supervisão de Miller. Entre eles estão Ed Annunziata (Ecco the Dolphin, Chakan the Forever Man, Kolibri), Bert Schroeder (ToeJam & Earl in Panic on Funkotron, Batman Returns CD) e Steve Apour (Bug!).

Participou do início do desenvolvimento do Sega Channel, quando negociavam com a Time Warner e engenheiros da TCI como funcionaria. Segundo Kalinske, Miller já estava convencido naquela época que o futuro estava nos games online. "Lembro dele falando muito, muito cedo sobre como nós todos estaríamos jogando videogames [online] por todo o país. Claro, no começo dos anos 90, ninguém estava falando disso".

Miller trabalhou em estreita colaboração com o departamento de marketing da SOA, criando um sólido relacionamento com envolvidos na promoção de software no qual ele estava no comando. A ex-diretora sênior de entretenimento e produtos da SOA, Michealene Risley, lembrou como Miller era acessível, e como sempre tinha a porta do escritório aberta para qualquer pessoa que precisasse de conselhos ou quisesse discutir os mais recentes desenvolvimentos de software. "Toda a equipe de desenvolvimento de produtos de Joe trabalhou em estreita colaboração com nossa equipe de licenciamento e entretenimento".

Miller foi um dos proponentes da parceria entre Sega e Silicon Graphics, para uso do chipset gráfico que acabou no Nintendo 64. Com o 32X, supervisionou toda a produção, citando a importância do dispositivo no aprendizado do Hitachi SH-2, mesmo processador usado no Saturn:

Uma das histórias que não foram contadas é que o 32X realmente ajudou equipes de desenvolvimento que tiveram sucesso no Genesis a mudar para o Hitachi SH-2 — dois SH-2 nesse caso — e havia um monte de rotinas , uma coleção de ferramentas e compiladores que foram criados para suportar o desenvolvimento 32X, que foram adaptados e portados para o Saturn.

Foi ainda membro fundador da Segasoft, empresa separada do grupo principal, pensada como forma de expandir a influência da Sega a outras plataformas, "capaz de competir em igualdade de condições com todas as outras empresas de software no negócio, fosse Electronic Arts, Activision, Ubisoft, ou seja quem for". A divisão cresceu ao ponto de ter 150 funcionários, movimentando mais de US$80 milhões no primeiro ano.

Pós-Sega

Miller deixou a Sega em agosto de 1996, depois de chefiar por um ano o setor de Pesquias e Desenvolvimento. Continuou ainda como consultor, antes de sair em definitivo da Sega em janeiro de 1997 para se juntar a Kalinske na Knowledge Universe Interactive Studio, empresa que este havia fundado visando criar ou investir com foco educacional no mundo todo. Clark Quinn, diretor de sistemas cognitivos na KUIS, descreveria Miller como "bem reservado, não só pessoal como profissionalmente, mas ele compartilhava o que pensava. Logo ficou claro que ele não só tinha a habilidade de engenharia de um verdeiro tecnicista, ele também tinha a visão estratégica de um executivo visionário".

Após deixar a Knowledge Universe, o grupo de consultoria da Miller, Perilux, foi contratado pela LeapFrog para criar um novo sistema de aprendizado multimídia. Com o diretor de engenharia da Leapfrog, Richard Hamilton, Miller fez parte da equipe que criou o Leapster em apenas 18 meses. O produto ganhou prêmios da Toy Industry Association de "Brinquedo Educacional do Ano" e "Brinquedo Inovador do Ano". Miller continuou como diretor administrativo da Perilux até falecer.

Em 2005, Miller tornou-se vice-presidente de desenvolvimento na Linden Lab, empresa especializada na criação de mundos virtuais. Miller trabalhou no recrutamento de talentos de engenharia necessários para desenvolver o principal produto da Linden, o jogo de mundo virtual Second Life. Sob sua liderança, a equipe cresceu de 20 para 200 membros. Novos centros de desenvolvimento foram abertos nos Estados Unidos, em cidades como Boston e Seattle, além de uma unidade em Cingapura. Miller também foi fundamental ao implementar voz 3D no Second Life em 2007.

O cargo final de Miller foi como vice-presidente de engenharia da Sportvision, empresa dedicada ao conteúdo esportivo digital e ao aprimoramento de eventos esportivos televisionados. A empresa fornece serviços digitais para praticamente todas as principais transmissões esportivas, incluindo NFL, NASCAR e MLB. Entre outras, a Sportvision criou a linha 1st & Ten em jogos da NFL, bem como a auréola azul que acompanha o puck nos jogos da NHL. O trabalho de Miller cobria uma ampla variedade de funções, incluindo dirigir a equipe de engenharia, buscar novas parcerias tecnológicas e aquisição e gerenciamento de dados. Miller serviu na Sportvision por menos de quatro anos, até seu falecimento.

Vida pessoal e legado

Miller foi casado com Sherri, que conheceu antes de se mudar de Ohio para a California, para trabalhar na Atari. Eles tiveram quatro filhos, numa união que durou até seu falecimento.

Embora não procurasse os holofotes, Miller era sempre aberto com seus colegas e subordinados. Sua figura alta e a voz grave seriam intimidadoras no começo, mas logo ele se revelava alguém divertido. Ken Balthaser e John Powers o descreveram como "intenso", e que após os primeiros contatos, "você descobria que ele era realmente um cara muito, muito legal".

Vidya Elangovan, engenheira e colega na Sportsvision, descreveu Miller como alguém que ao primeiro contato, seria erroneamente visto como um homem reservado e de poucas palavras. Mas a convivência revelava alguém que se preocupava com os membros da equipe, um grande ouvinte, disposto a solucionar problemas.

Em sua longa carreira, Miller passou por algumas das principais empresas de games da história. Ajudou a consolidar ou trabalhou diretamente com padrões do futuro, como estúdios musicais voltados aos games, o conteúdo na internet e o marketing de mascotes. Sem seu trabalho, boa parte do que foi feito na Sega of America nos melhores anos da empresa teria sido diferente em diversos aspectos.

Mesmo distante de seu sonho inicial de ser astronauta, Miller continuou interessado pelo tema. Segundo sua família em um site de memórias:

Joe nunca saciou sua sede de conhecimento. Nunca descobrimos se isso era pura curiosidade, ou simplesmente um subproduto de sua meta vitalícia de estar sempre "certo"; suspeitamos que o primeiro, já que sua visita adulta ao Space Camp não lhe rendeu nenhum argumento.

Miller faleceu em 27/07/2014, vítima de câncer de estômago, aos 60 anos.

Bibliografia

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