Análise Cyber Shadow: mistura homogênea de ninja retrô e moderno

Você inicia o jogo. É recebido por uma tela-título minimalista, em pixel art. Ao começar, está no comando de um ninja em ação lateral com plataformas. Shurikens e espadas. Um chiptune como trilha sonora. Direcional e dois botões.

Você morre, morre de novo. Morre até decorar a posição e comportamento dos inimigos para enfim passar a bendita fase.

Essa cena podia ser nos anos 90 jogando Ninja Gaiden no seu NES. Mas é de 2021. Cyber Shadow, lançado em janeiro, é uma homenagem criativa aos jogos do gênero. Mesclando elementos de gerações diferentes, vai agradar jogadores um pouco mais velhos. E também você jovem que não pegou aquele tempo, mas gosta de desafios old school, gráficos pixelados e dificuldade.

Pixel show

cyber shadow pc
O início de Cyber Shadow. Pois é, tem opções de idioma, mas a ação vale mais que a história.

À primeira vista e jogada, Cyber Shadow não inventa muito, sendo centrado na geração que o inspira. É pixel art puro, regado por trilha sonora em chiptune. A jogabilidade segue a cartilha das plataformas em ação lateral. O impacto inicial da experiência é um tom forte nostálgico. Roots mesmo.

Como um pseudoclone de Ninja Gaiden, o protagonista Shadow começa bastante incompetente. Ele nem consegue fazer movimentos básicos como agarrar em paredes e agachar. Se não evoluísse, seria uma vergonha para os clãs ninja, de fato.

Essa incapacidade inicial faz o simples combate com inimigos menores, que atacam em diagonal, ficar comprometida. Você se pega correndo, pulando ou usando outros truques para não ser atingido – já que só acerta o inimigo em linha reta.

Daí vem a graça de Cyber Shadow. Melhorias obtidas pelo caminho enriquecem o herói, com ataques mais fortes ou de mais alcance. Ele aprende a atirar shurikens, dar espadadas de fogo para o alto, usar escudos e magias que cruzam paredes. Naturalmente isso enriquece a ação. A progressão da dificuldade envolve o uso dessas mecânicas, então ao ganhar um escudo que absorve disparos, você terá novas formas de enfrentar inimigos específicos.

A coleta de itens não tem muita invencionice, mas com seus momentos. Além da energia, a barra de Spirit funciona como um tipo de magia. Com ela, Shadow pode realizar golpes especiais: lançar estrelas, espadadas com fogo, etc. Também podem ser "compradas" melhorias cibernéticas como recuperação de energia e armas de duração limitada. A lâmina giratória e o escudo ajudam muito.

Há poderes obtidos no fim de cada estágio. Shadow ganha uma habilidade permanente e o jogo fica progressivamente mais interessante. Escalar e deslizar pelas paredes, dashes que cortam inimigos e também permitem avançar depressa, etc. Receber essas habilidades aos poucos em vez de tê-las desde o princípio cria um senso de conquista e recompensa muito divertido. Se começou e não gostou muito, insista um pouco porque vai melhorar.

(Quase) até a raiz

cyber shadow escolha estagio
Os capítulos anteriores podem ser jogados de novo. Com novas habilidades, pode ser boa ideia voltar e reexplorar a fase.

Ao contrário do passado – felizmente pra mim, que não tenho a paciência e tempo livre de antes – não há limite de vidas. O desenvolvedor foi criativo, inserindo muitas formas de acabar com Shadow, não se limitando a copiar mecânicas batidas. De repente você está pulando entre espetos assassinos (tipo caiu morreu) e um MEGA LASER corta a tela, destruindo o ninja e o que estiver no caminho. Ou quem sabe o herói é jogado em moedores de pedra e buracos sem fundo.

Isso quantas vezes quiser, rapidamente voltando a um ponto de checagem. Eles estão por toda parte, aparecendo após cada seção mais longa das fases. Além de garantir seu retorno (mesmo que desligue e resolva tentar mais tarde), também enchem sua energia e ainda dão uns brindes. Há constante incentivo a continuar tentando. Morreu uma, dez, trinta vezes? Tente outra vez. E se chegar à conclusão de que o ninja não está pronto, pode percorrer estágios anteriores, coletando power ups e renovando o arsenal.

Essa "facilidade" não é tão fiel à dificuldade hardcore do passado, mas atende tanto a um tiozão cansado quanto eu, quanto ao novinho que não teria saco de jogar dezenas de vezes desde o início. No máximo, vai enfrentar dezenas de vezes aquela seção e batê-las é como jogar vários minigames em sequência. Apesar de bem distribuídos, alguns checkpoints são cruéis, com seções complicadas em sequência antes de salvar o jogo (que não é muito curto).

E acredite: após a primeira fase, que parece um treino, a coisa vai complicar. Em alguns trechos, serão vários inimigos ao mesmo tempo pulando, voando, correndo em atirando. E alguns com respawn após serem destruídos, não dando tempo para ficar de bobeira.

O que é uma pena, porque os cenários são bonitos, com muitas plataformas interativas, buracos, portas, tochas, folhas... O cuidado com detalhes proporciona cenários ótimos, como do "Santuário Macaco", cheio de objetos em movimento em vários planos e efeitos especiais. Das poças d'água em que Shadow pisa ao efeitos de raios e fogo, há muita animação por toda parte.

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Dedicação aos detalhes

O design intrincado convida a parar de vez em quando, se possível. Respirar, examinar o caminho, o comportamento dos inimigos. Se não o fizer, acaba tentando um salto só para ser jogado numa armadilha marota. Tentar jogar rápido demais termina mal, porque inimigos surgem de repente, seja voando ou brotando de buracos. Eles vão empurrá-lo para fossos elétricos e outros destinos nada agradáveis. Tal como no visual, o level design teve visível cuidado.

Certos pontos são um pouco confusos. Quando muita coisa acontece ao mesmo tempo, você morre às vezes sem entender o que te acertou. Enquanto não aprende a escalar, certas plataformas ficam tão distantes que você não acredita no salto. Outras se movem, desmoronam e algumas precisam ser ativadas. Felizmente os controles são impecáveis, com um esquema tradicionalíssimo de dois botões + direcional. O conforto é imediato.

Os inimigos respeitam a temática do "vilão cibernético". Você quase se sente no mundo de Sonic, cercado de robôs assassinos por toda parte. Ou (referências mais óbvias de forma geral) no mundo de Mega Man ou Metroid. Há aves mecânicas que soltam aves menores – e que devido àquela incompetência inicial do personagem, tira preciosos pontos de energia. Outros são humanoides, como robôs, ninjas cibernéticos e máquinas estranhas. São variados e 100% dentro do enredo.

cyber shadow capitulo 3
Logo você vai aprender a odiar essas bolinhas roxas. O design das fases é ótimo, com escolha de cores que não confunde entre elementos de fundo e primeiro plano.

Desafio atenuado

Chefes de fase são diversos, numa boa mescla de estilos e influências. Achei que seriam um pesadelo na linha Mega Man, mas não chegam a tanto. Podem ser pequenos e ágeis, ou titãs do tamanho da tela. Uma boa adição é quando mudam após a primeira barra de energia – você se empolga achando que venceu, só pra descobrir que o malandro evoluiu para uma nova forma. Sacanagem do bem.

Também fiéis ao enredo, usam recursos hi-tech como canhões, miras eletrônicas e lasers, às vezes despejando projéteis por toda parte. São momentos que remetem a Metal Slug e outros run and gun, tamanho o caos.

Chefes não tão difíceis? Profusão de checkpoints, habilidades desbloqueadas? Um hardcore da vida pode ler e pensar que Cyber Shadow é fácil. Mas não é bem assim. O desafio é sem dúvida mais suave que o padrão clássico. Mas essa "caridade" é balanceada com dificuldade progressiva. Não dá pra escapar do velho esquema: é apanhar algumas ou dezenas de vezes até aprender a rotina.

Até descobrir como derrotar o miserável do Mekadragon, por exemplo, você vai estar espumando de ódio e botando a culpa no controle. Depois, um abraço.

cyber shadow cutscene cinematica
Cutscenes entregam parte da história, mas dando maior fluidez, há diálogos durante o jogo.

E a história? Tem uma sendo contada aos poucos. Nada espetacular, mas serve para embalar a ação. Uma boa escolha foi passar a narrativa de várias formas, não só por cenas intermediárias. Durante a ação, você vê diálogos e pistas conversando com chefes ou examinando corpos. Personagens como o robozinho L-Gion contam que Shadow não lembra, mas está lutando por seu clã contra o Dr. Progen e seu exército de máquinas.

Por quê? Melhor você jogar, mas o que importa mesmo é a jogabilidade

O melhor do passado

Com jogos retrô cada vez mais representados e apreciados, esse tipo de produção vai seguir aparecendo. Sorte nossa, porque Cyber Shadow vale o preço, com horas de diversão – e muitas vidas até obter as habilidades que o tornam algo cada vez mais interessante.

Não é perfeito. A trilha é agradável, encaixada, mas um pouco básica demais pro meu gosto. Você vai lembrar de poucas faixas horas após jogar. Pontos ocasionais se confundem com o cenário e exigem atenção redobrada, como personagens caídos – quase passei batido por alguns. E uma vez absorvidos os padrões dos chefes, tornam-se simples ao ponto de você ter raiva por ter morrido tantas vezes.

O design de inimigos e cenários é excelente e gráficos só merecem elogios, numa fusão eficaz de passado e presente. Controle e jogabilidade são tão bons que instigam a seguir explorando e descobrindo novas habilidades. Recomendação fácil.

cyber shadow tela titulo

Não se engane com o começo mais lento. Com três ou quatro habilidades, as melhores partes de Cyber Shadow começam a emergir.

Vale lembrar também que quase tudo foi feito por uma pessoa: o finlandês Aarne Hunziker – único membro de sua desenvolvedora, a Mechanical Head. Nota 10 pra ele, independente da nota do jogo. E para a publicadora Yatch Club, mesma do já clássico Shovel Knight.

O jogo foi revisado pela versão PC, mas também foi lançado para PlayStation 4, Switch, Linux, Mac OS, PlayStation 5 e Xbox One.
Daniel Lemes
Daniel Lemes
Fundador do MB, quase mil artigos publicados em dez anos pesquisando e escrevendo sobre games. Ex-seguista, fã de Smashing Pumpkins e Yu Suzuki.

1 COMENTÁRIO

  1. Belíssimo game!!!! talvez ninja gaiden 3 do nes seja o jogo que mais jogo da era 8 bits, ainda!!!! Gosto muito da série ninja gaiden do nes e até do clássico Kage também conhecido como shadow of the ninja da Natsume...clássicos que sempre jogo mesmo!!!! Ao deparar com cyber Shadow, de imediato lembrei dos clássicos ninja da era NES...Gráficos dukralho, jogabilidade dukralho e músicas dukralho!!!! é um verdadeiro jogo dukralho!!!! Recomendo para a geração atual que mete o pau nos jogos 8 bits da vida!!!! valeu

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