R360, a cabine de arcade da Sega pra quem tem estômago forte

É um videogame? É uma montanha-russa? Talvez um pouco de ambos explique o R360, (de Rotate 360°), cabine de arcade muito louca produzida pela Sega na década de 90, mais exatamente entre 1991 e 1994.

Um monstro de quase uma tonelada, com assento e mecanismos típicos de brinquedos de parques de diversões, incluindo trava de ombro e cinto de segurança. O objetivo é colocar você no comando de um avião de caça.

R360 em movimento

E não se engane pensando que o aparato é estético. Conforme o avião gira na tela, os movimentos são reproduzidos na sua cápsula (respondendo ao joystick), uma esfera achatada girando em eixos mecânicos, em todas as direções. O avião inclinou pra direita? Sua cápsula inclina também. Deu um parafuso? Prepare-se pra ver o mundo girando. Tudo para dar ao jogador a experiência mais próxima de estar num avião de verdade.

Foram feitas cabines só com dois games: Wing Warcom gráficos poligonais e aviões estilo 2ª Guerra, e G-LOC: Air Battle, tipo de continuação não-oficial da clássica série After Burner, que já existia desde 1990.

Um monstro

Com um monitor de 20 polegadas dentro da cabine e outro de 10 na torre de controle, nada escapa aos olhares de quem acompanhar a partida. Ou seja, nem adianta mentir dizendo que foi bem, a torre te denuncia... O objetivo no G-LOC é derrubar certo número de inimigos entre 50 que aparecem; jogada curta para o alto preço das fichas, por sinal.

Tal como montanhas-russas e outros brinquedos radicais, o R360 não é indicado para cardíacos, pessoas com problemas de pressão ou (por causa da trava) com menos de 1,30 metro. É fundamental não deixar objetos soltos dentro da cabine, ou corre o risco dela voltar na sua cara quando o negócio esquentar. 

R360 - posições do cockpit

O game exige muitos giros para escapar dos inimigos. Pense numa sessão ali dentro virando em todas as direções ?. E o movimento é razoavelmente rápido, o bastante para machucar em caso de acidente.

No cockpit, além da trava, há um "botão de emergência". Ao pressioná-lo, soa um alarme, e a cabine não volta à posição normal imediatamente, mas para do jeito que estiver. O operador, do lado de fora, precisa confirmar; ele checa se está tudo certo e pressiona outro botão em seu painel, e então o compartimento volta suavemente à posição original. O mundo também gira quando sua nave é abatida, num movimento parecido com o parafuso da queda.

Outra medida de segurança é um sensor de presença na plataforma: se alguém chegar perto do aparelho em operação, ele para imediatamente. Uma cabeça enfiada ali dentro durante o jogo pode resultar fácil num acidente gravíssimo.

R360 Supergame
R360 em operação no Shopping Morumbi, em 1992. Foto: Supergame, julho de 1992.

A primeira unidade apareceu no Brasil em São Paulo, no Shopping Morumbi, em 1992; foi destaque nas revistas da época, como a Supergame. Quem experimentou afirma que os movimentos não eram lá muito precisos. O giro não correspondia exatamente ao da nave e era um tanto lento, pois agitar o jogador mais depressa poderia causar danos à saúde, como vasos rompidos, problemas de pressão e outros relacionados à força G. O peso da cabine também não ajudava.

As versões originais tinham slot de fichas na torre de controle, mas algumas unidades americanas saíram sem slot. A decisão da Sega tornava, por segurança, imprescindível a presença do operador para dar o crédito e supervisionar a brincadeira.

Duas placas alimentaram o R360: Sega Y Board, de 1988, e a Model 1, de 1992. A primeira teve mais games cogitados para a cabine, entre eles Strike Fighter e After Burner II. Já a mítica Model 1 foi usada no fim da vida, com Wing War sendo o último lançamento -- sua melhor fase havia passado, quando apresentou ao mundo jogos poligonais como Virtua Fighter e Virtua Racing.

Wing War teve suporte a multiplayer. Imagine conectar dois R360 (haja espaço e dinheiro) e jogar no modo dogfight, um duelo de aviões...

De luxo

Será que rolava ter uma em casa?

O preço, lógico, era bem salgado, e poucas máquinas deram as caras por aqui, imagine colocar na sua humilde residência... A não ser que você fosse o Michael Jackson -- veja na página 27 que ele tinha uma em seu rancho Neverland.

Além do valor, ela pesa muito: 2200 libras, algo como 998 kg. E até certo ponto, é perigosa, pois se a trava ou o sensor de presença não funcionarem direito, pode matar tranquilamente.

R360 - trava e cinto
Trava de ombro e cinto para aguentar o movimento do R360

Yu Suzuki [biografia], gênio da Sega que desenvolveu clássicos como os Virtua, Out Run e Shenmue, supervisionou o R360. Segundo ele, os primeiros testes vieram depois da cabine de After Burner, como uma evolução natural:

Usamos um motor de eixo duplo para controlar a cabine [em After Burner]. Um avião tem liberdade de 360º, mas num arcade o movimento era limitado, e o time de hardware queria muito uma cabine com giro em 360.

Um dia, um de meus colegas do hardware me chamou até a varanda e disse "Não vá almoçar ainda!". Subi as escadas e vi uma cadeira ligada a uma massa de cabos. Eles me afivelarem nela e me empurraram, e lá estava eu girando e girando na varanda do quinto andar [risos].

Um dos obstáculos iniciais era o enjoo durante a experiência. A solução foi descoberta após incansáveis testes. "Sim, fizemos muitos experimentos", contou Suzuki, "e descobrimos que o centro de rotação tinha que ser mais ou menos no estômago das pessoas, caso contrário vomitariam. O desenvolvimento foi caro, e tivemos que vencer muitos problemas. Todos trabalharam duro naquilo".

Ele também contou sobre um incidente ocorrido mais de uma vez: programadores presos no protótipo. "'Não opere a máquina sozinho', era o decreto. Mas um dos programadores não seguiu as regras e a trava de segurança não soltou. Então ele ficou preso de cabeça pra baixo a noite toda, até que alguém o encontrou no dia seguinte. Ele foi um tipo de modelo!" [Do que podia acontecer ao usar o R360 sozinho.]

Suzuki relatou também que o resultado impressionou a ponto de uma empresa de armamentos tentar adaptar o R360 a fins militares:

Simuladores de aviação militar custavam cerca de 300 milhões de dólares na época, então uma negociante de armas do leste europeu veio com uma oferta. Perguntaram se podíamos modificar a cabine do R360 para que se tornasse um simulador. Mesmo que vendêssemos uma por 10 milhões, ainda seria 30 vezes mais barato do que eles poderiam comprar em qualquer outro lugar. Infelizmente não pudemos fazer isso, já que produzíamos máquinas apesar para uso civil.

O R360 opera apenas a 220V trifásico, com consumo de 2500 watts. Apesar do videogame, pelas demais características, está mais para brinquedo de parques.

Vejam um vídeo dela em uso. Parece divertido.

O R360 foi uma experiência e tanto na Sega, que tinha histórico com cabines inovadoras de arcade. Realizar a rotativa, depois da móvel de After Burner, foi algo como a "conquista final" no assunto, e eles se focariam em outra inovação: gráficos em 3D.

Como lembraria o próprio Suzuki:

Superamos muitos problemas técnicos, como os montes de dados e transmissão de energia, como nos grandes brinquedos de parques. Mas para um arcade com limitações em voltagens, ruído, espaço no piso e custos, foi muito apertado. Completando o R360, finalmente conseguimos alcançar as metas originais, então ficamos um pouco perdidos depois dele. Acho que o passo seguinte foi melhorar os gráficos e nos mover para o 3D.

Realmente se moveram. A placa Model 1 viria com os polígonos de Virtua Racing e Virtua Fighter, abrindo a nova geração tecnológica.

Onde comprar um R360

O colecionador americano Kevin Keinert é um especialista em R360, tendo comprado e restaurado algumas máquinas. Talvez ele saiba mais sobre elas do que o próprio pessoal da Sega atual. Confira os links, têm bastante material.

Se quiser uma, fale com ele. Quanto vale? De 3 a 6 mil dólares, dependendo do estado.

Flyer R360 japão

 

Daniel Lemes
Daniel Lemes
Fundador do MB, mais de mil artigos publicados, mais de dez anos pesquisando e escrevendo sobre games. Ex-seguista, fã de Smashing Pumpkins e Yu Suzuki.

7 COMENTÁRIOS

  1. Não vejo a Hora de ter uma dessas no meu quarto ....fiquei sabendo que tem um cara em São Paulo Capital que esta desenvolvendo uma semelhante , porem mais compacta ...........tomara q seja verdade ....

  2. Estava eu sentado no sofa da minha casa, no RJ...Quando passa no Jornal Nacional que tinha chegado a R360 em SP. Eu calmamente levantei, fui pro meu quarto, troquei de roupa, peguei minha malinha com meus trecos-de-viagem e falei pra mamae..."Mae, to indo a Sao Paulo jogar fliperama!". Minha mae teve quase um troço.
    Liguei pro meu sidekick Lauro Faria, do BDI BBS (:D) falei pra ele me encontrar na rodoviaria e...la fomos nós de buzao pra SP. Chegamos em SP antes do shopping abrir, fiquei esperando na porta. Quando entrei, era o segundo da fila. Fui ao caixa e comprei CEM FICHAS (!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!). Entreguei todas na mao da operadora da maquina e falei "So me tira daqui quando acabarem as fichas". O povo nao ficou muito feliz nao. Mas eu joguei R360 ate enjoar 😀

  3. Pilotei no S.Morumbi e no S.Center Norte em São Paulo , viciei ... Não vi nunca pilotei nada igual [ simulador ].... Meu record 33 avioes abatidos kkk....

  4. Daniel, saudações!
    Eu tive o privilégio de jogar o G-Loc neste equipamento do Shopping Morumbi e é indescritível sentir o jogo com o corpo. Aproveitei pra experimentar todo tipo de manobra e voei invertido um bom tempo, sentido o meu peso nos ombros e os pés batendo no painel da base da tela.
    O jogo começa já te "desorientando" pois o F14 decola e já dá um barrel roll o que já bagunça tua cabeça e tira alguns referenciais da sua posição inicial. Os movimentos eram muito rápidos e a precisão suficientemente grande - eu tive que amarrar meus óculos na cabeça pra não perdê-los em uma dessas viradas bruscas.
    Enfim, boas lembranças da máquina, que tinha fila sempre e era um tanto cara pro meu bolso na época, mas valeu cada centavo.
    Abraço!
    Fabio Ramiro

    • Legal, eu até tive vontade de experimentar, mas como não era frequentador de shoppings, não tive a chance. Os movimentos pareciam ser um tanto bruscos, e tinha recomendações sobre não ficar com objetos soltos, como acessórios, correntes, etc. Mesmo assim, ela tinha um baita visual!
      Abraço!

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