Nintendo World Championships 2015 e a história do torneio original

The Nintendo World Championships are back!

Com essa mensagem em sua página sobre a E3, a Nintendo confirma a realização de uma nova edição do "mundial", 25 anos após o primeiro, que partindo de Dallas a 08/03/1990, percorreu cidades dos Estados Unidos e Canadá, até enfim proclamar 3 jogadores campeões em categorias por faixa etária.

O que se sabe, por enquanto, é que será igualmente dividido por idade, e — isso não tinha em 1990 — transmissão em live stream no dia 14/06/2015, um domingo. Pela descrição, podemos esperar um abuso da nostalgia, até com o logotipo clássico. Deve ter aquele clima épico e dramático que americanos adoram, com jogadores se digladiando num palco, narradores e a galera vibrando. As etapas de classificação começam no próximo dia 30.

Pena que provavelmente o "mundo" da Nintendo continua sendo os Estados Unidos, já que o evento será durante a E3. Eles fizeram um vídeo engraçadinho, em que Reggie Fils-Aime (presidente da Nintendo of America) idealiza o campeonato e decide participar dele. Ele põe um moleque na presidência enquanto se prepara, claro, com itens da casa: faz musculação com dois GameCubes, luta boxe no Wii e corre com um Power Pad (no final, apela batendo nos pads com as mãos).

É uma oportunidade de fortalecer a marca, como no torneio de 90 que serviu de pré-lançamento para títulos como Super Mario Bros. 3. O lançamento do shooter com temática infantil e elementos de estratégia, Splatoon (Wii U), será um dia antes do início das classificatórias, e é forte candidato a aparecer na lista de jogos usados, assim como como Mario Kart 8 e Super Smash Bros.

Se vai funcionar é outra história. O público não é de maioria infantil como outrora, o grosso dos jogadores está na faixa dos 30 anos. Será que essa abordagem, e restrita ao universo da Nintendo, terá apelo com tal perfil? E entre "não-nintendistas"?

De qualquer forma, quem sabe seja a faísca de ignição para algo maior, como mundiais de verdade, com cobertura global e anuais, num molde similar ao mundial de Pokémon, que rola desde 2009?

Atualização 19/05: hoje a Nintendo deu mais informações sobre o campeonato. Serão 8 classificatórias em lojas Best Buy espalhadas pelos Estados Unidos, todos no dia 30/05. Os games usados serão Super Mario Bros., Super Mario Bros. 3 e Dr. Mario no Ultimate NES Remix (3DS), no Championship Mode. Ou seja, é pra abusar da nostalgia mesmo.

Os campeões locais ganham viagem com acompanhante, estadia, vaga na final em Los Angeles e um gift card de 250 dólares.

Um pouco de história

insiders guide nwc 1990
Capa do "Insider's Guide" que era oferecido nos classificatórios do mundial da Nintendo

A estreia do torneio foi no Automobile Building, no Fair Park, num grande evento dividido em 3 dias, com várias atrações. Na seção Power Walk, por exemplo, visitantes conferiam games em primeira mão, entre eles Chip & Dale's Rescue Rangers, além de recentes como Batman, Robocop e Super Mario Bros. 3.

Outra atração era o Super Stage, onde o Game Counselors (time de funcionários da Nintendo que manjavam tudo de games, responsáveis pelo Power Line) respondia dúvidas sobre os jogos mais obscuros que a molecada podia lembrar, dava dicas diversas, e até desfilava no palco com roupas estilo Zelda. Havia rampas de skate, centenas de monitores com NES para jogar, programas multimídia com música, e muito mais. Um paraíso para qualquer nintendista.

A atração principal era a área do campeonato, baseado no enredo do filme O Gênio do Videogame (The Wizard, de 1989). Estrelado por Fred Savage, o menino do seriado Anos Incríveis, mostra três crianças — incluindo um garoto autista fera nos games — numa aventura para chegar ao torneio "Video Armageddon", que por coincidência ou não, também acontece nos estúdios da Universal, como seria mais tarde naquele ano a etapa final.

A produção é recheada de nomes conhecidos, como máquinas PlayChoice-10 (um NES em formato arcade), Metroid, Power Glove, Double Dragon, parques temáticos da Universal e a final com Super Mario Bros. 3, então inédito. Com muita grana da Big N envolvida, é um comercial de 100 minutos em formato de filme, e a crítica pegou pesado, como o Washington Post, que mandou "The Wizard não é só brega e moribundo, mas também ensina jogos de azar e falta de espírito esportivo".

É um hit da Sessão da Tarde. Qualquer hora escrevo sobre ele.

o genio do videogame
Clássico das Sessões da Tarde, O Gênio do Videogame foi destruído pela crítica. O menorzinho é o "mago" dos games.

No NWC, jogadores competiram em categorias por idade (até 11 anos, de 12 a 17, e 18 ou acima), usando cartuchos reprogramados para a disputa. Durante os três dias, qualificaram-se para as semifinais em duas rodadas; a primeira, na sexta-feira, exigia ao menos 175 mil pontos, e a segunda, no dia seguinte, 200 mil.

Os campeões de classificatórios por todo o país ganharam um troféu, US$250 e viagem com acompanhante para a final na Universal Studios Hollywood. Os vice-campeões ganharam um Power Pad e um Game Boy como prêmio de consolação.

Final

Na final nacional foi adotado um formato similar aos "qualifyings". Tudo parte do festival maior, o PowerFest, com atrações e exposição dos produtos Nintendo que marcaram a turnê pelo país.

No domingo, todos jogaram ao mesmo tempo em máquinas paralelas, e só os 7 melhores por categoria foram para uma finalíssima no palco principal, com narração e aquelas coisas dramáticas. Os 21 melhores competiriam pela glória máxima, mas desses, só dois por categoria enfim alcançariam a disputa mano-a-mano pelo título.

Eles tinham 6 minutos e 21 segundos para jogar três minigames: o primeiro era coletar 50 moedas em Super Mario Bros.; o segundo, completar um circuito personalizado em Rad Racer, e o último, uma partida de Tetris até o tempo terminar. Encerrado o tempo, o cartucho especial usava uma fórmula para calcular o placar final:

Placar de Super Mario Bros.
+
Placar de Rad Racer x 10
+
Placar de Tetris x 25
_______________________
Placar final

nwc 1990 game score
O cartucho do torneio tem os três games, e ao fim do tempo programado, faz o cálculo do placar total. Pelo meu resultado, acho que não teria ido muito bem...

Como conseguiriam as pontuações era problema de cada um, então escolher o método mais rápido faria a diferença. Por exemplo: havia dois caminhos para coletar as moedas exigidas em Super Mario Bros.: descer pelo terceiro cano, coletar 20 moedas, terminar a fase e pegar o resto no mundo 1-2. O outro era descer, pegar 20 moedas, então morrer e seguir pegando moedas no bloco logo adiante. Foi assim que Thor Aackerlund (que aliás, é um dos maiores jogadores de Tetris da história) garantiu o título na categoria 12-17 anos.

Rad Racer e Super Mario eram modificados para impedir game over, mas em Tetris não tinha moleza, e se empilhasse os blocos muito cedo, o jogador ficaria assistindo uma tela congelada até o fim do tempo.

Os campeões:

  • Jeff Hansen (de Tampa): categoria até 11 anos
  • Thor Aackerlund (de Houston): categoria 12-17 anos
  • Robert Whiteman (de Nova Iorque): categoria 18+ anos

Os prêmios da final melhoraram: perdedores entre os finalistas receberam mil dólares (em títulos). O campeão de cada categoria levou 10 mil dólares, um conversível da Suzuki, uma TV de retroprojeção de 40 polegadas, e um troféu dourado de Mario.

Esse aqui ↓

1990 Nintendo World Championship Gold Trophy Mario
Troféu recebido por Thor Aackerlund, pelo título na categoria 12 a 17 anos. Feio de doer, mas de um valor histórico inestimável.

Não houve disputa oficial entre os campeões, mas numa rodada informal pós-torneio, Aackerlund venceu, com Hansen em segundo e Whiteman em último. Ironicamente, Aackerlund tornou-se porta-voz da Camerica nos Estados Unidos depois do torneio (concorrente da Nintendo e uma das companhias que produziam jogos sem licença, violando a trava de segurança do NES). Quase vinte anos depois de sumido do meio, ele reemergiu no campeonato mundial de Tetris.

Hansen representou seu país na disputa do mundial no Japão, e depois numa revanche em Las Vegas, as duas vezes batendo o campeão japonês, Yuichi Suyama.

Os cartuchos especiais

Talvez mais conhecidos que qualquer outro item do mundial, os cartuchos são parte do que há de mais procurado por colecionadores. Os usados durante o campeonato (90 cartuchos) tem case cinza, e foram dados aos finalistas ao término da competição. Mais emblemáticos ainda são os 26 cartuchos dourados dados pela revista Nintendo Power na fase promocional.

Os carts cinza são numerados, o que os torna difíceis de falsificar, mas os dourados não. Reproduções como as vendidas no site RetroUSB são feitas propositalmente em plástico azul translúcido, exatamente para evitar confusão com os reais. Quem teve a feliz ideia de guardar as relíquias, hoje consegue belos valores nelas.

Heather Martin, por exemplo, foi campeã da categoria até 11 anos na classificatória de Oklahoma, mas cometeu um erro no Rad Racer e perdeu a chance de ser campeã na final em Hollywood. Mesmo após largar os games, manteve seu cartucho cinza guardado e quase 20 anos depois, o vendeu por 8 mil dólares. Com o dinheiro, fez um belo passeio com a família na Disney.

Heather Marin Ireland
Heather Martin (hoje Heather Ireland), uma das finalistas, com a placa do torneio, seu troféu de campeã local em Oklahoma, e um cartucho cinza, em 2011. Foto: Heather Marin / Wired

Os dourados são o verdadeiro Santo Graal dos colecionadores de NES e acessórios, com valor inferior apenas ao raríssimo Stadium Events versão NTSC, retirado das prateleiras pouco depois de lançado e quase todos destruídos.

Dos 26 produzidos, apenas 13 deram as caras até hoje. Raramente aparecem no eBay, sempre com valores muito altos. No começo de 2014, um foi vendido alegadamente por quase cem mil dólares. Negociações anteriores ficaram em $21,4 mil (2007), $15 mil (2008) e $18 mil (2009). Já os cinza saem por valores que vão de 3 a 10 mil.

As placas internas são idênticas nos dois tipos de carts, e ambas têm switches para controlar o tempo de partida. Nas máquinas da competição, havia um switch para iniciar todas as partidas simultaneamente.

?

Talvez o Nintendo World Championships 2015 consiga promover novos itens ao estado de raridade que carts cinza e dourados chegaram. Quem sabe Amiibos em edição especial, ou controles dourados limitados? Ou num mundo em que competições online são tão fáceis quanto fazer login e jogar, a reunião de pessoas do país todo num espaço físico não tenha o mesmo apelo do passado. Resta aguardar para saber.

Atualização: o campeonato teve várias rodadas que incluíram Metroid Prime: Federation Force, Balloon Fight e Mario Kart 8, até a final com uma fase customizada de Super Mario Maker. O vencedor foi John Goldberg (ou John Numbers), de 23 anos. Ele recebeu um New 3DS XL autografado por Shigeru Miyamoto e um troféu dourado de Mario, muito melhor acabado mas similar ao dado no torneio de 1990. O vice-campeão foi Cosmo Wright, 26 anos, que também ganhou um New 3DS XL autografado.

Imagine o preço desses 3DS daqui uns anos...

nwc final john numbers cosmo

FonteAtariHQ
Daniel Lemes
Daniel Lemes
Fundador do MB, quase mil artigos publicados em dez anos pesquisando e escrevendo sobre games. Ex-seguista, fã de Smashing Pumpkins e Yu Suzuki.

2 COMENTÁRIOS

  1. Independente do resultado a disposição da Nintendo em fazer essa ligação do futuro com os videogames clássicos já é louvável.A Sony não pode fazer porque não tem história suficiente para isso.Convenhamos que o PS1 é um novato.E o coração da Microsoft bate forte por software,essa é a alma da empresa.Videogames mesmo,só a Nintendo tem o que mostrar no quesito,resgate histórico.

    • Verdade, pelo menos pra torneios que explorem a história, mesclando com sucessos de hoje, ninguém tem conteúdo como a Nintendo. Tomara que tomem gosto pela coisa e vire algo frequente, num formato mais aberto, "mundial" de fato.

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