Games podem causar alterações em como você vê o mundo

Depois de uma longa noitada de GTA V, você desliga o videogame, pega seu carro e sai para trabalhar. De repente começa a ter visões de um HUD igual ao do game em seu para-brisa. Ou imagine depois de horas jogando Tetris, você notar a incrível e insólita semelhança entre os prédios da sua rua e os blocos do game, quem sabe até imaginando encaixes entre eles. Ou pior: passa a enxergar tudo meio quadradão depois de uma longa sessão de Minecraft.

Por mais que pareça legal ter um HUD virtual no seu carro, nesse caso não seria... Segundo estudo conduzido por Angelica Ortiz de Gortari e Professor Mark Griffiths, pesquisadores da Nottingham Trent University (Reino Unido), os games podem causar, se jogados de forma intensiva, efeitos pós-partida - gamers pesquisados relataram distorções visuais do mundo real após as sessões.

Que viagem, cara...

Alguns afirmaram ver menus pop-up aparecendo em frente a seus olhos enquanto conversavam com amigos; outros viram imagens coloridas e HUDs enquanto dirigiam. Outros ainda tiveram dificuldade para dormir ou flashbacks depois das partidas - associações involuntárias entre objetos do cotidiano e dos games. As percepções, que podem ocorrer durante, imediatamente após ou muito tempo depois de jogar, foram chamadas de Game Transfer Phenomena (GTP).

GTA Hud na rua
Imagine você andando de boas na rua... de repente começa a ver menus e itens dos games!

Foram analisados 483 jogadores de 54 fóruns. A conclusão foi que exposição intensiva pode resultar em ilusões e distorções de objetos e ambientes da vida real, e pseudo-alucinações com conteúdos dos games.

Ilusões visuais são conhecidas por facilmente enganar o cérebro, como ao observar fixamente um estímulo gerador do efeito de "imagens fantasmas". Um exemplo é manjado nas redes sociais: a garota em negativo que impressiona a vista e pode ser "revelada" se olharmos depois para um fundo claro.

Mas o estudo aponta que o GTP é ativado por associações - involuntárias ou não - entre experiências do videogame e objetos e contextos da vida real, causando problemas como insônia, situações embaraçosas e até questionamentos sobre a própria sanidade. Entre elas estão "percepções sensoriais alteradas, processos mentais automáticos, ações automáticas e comportamentos".

O mais relatado foi o "motion sickness" (do qual já falamos aqui), além de:

  • visões em "cascata" ou "ondas" após jogar games musicais tipo Guitar Hero.
  • ver barras de energia sobre a cabeça dos amigos depois de jogar WoW (que legal, caras! Queria ver isso).
  • ver peças de Tetris caindo na visão periférica ou quando se fecha os olhos.
  • ver a roda de conversação de Mass Effect ao conversar com alguém.
  • o mais assustador: ver alvos em pessoas depois de longas noites jogando Call of Duty.

Por outro lado, nem tudo pode ser ruim. A capacidade de absorver um aprendizado "in-game" também foi considerada ao avaliar os resultados - sem esquecer dos potenciais perigos.

Segundo Gortari:

Experiências visuais identificadas no GTP nos mostraram a interação de mecanismos fisiológicos, perceptuais e cognitivos, e o potencial de aprendizagem com videogames, mesmo sem consciência. Também nos convida a refletir sobre os efeitos de exposições prolongadas a estímulos sintéticos.

Segundo ela, o perfil psicológico dos jogadores não influiu no resultado, já que os dados foram coletados dos mais variados gamers através de fóruns online, e esses diferentes jogadores relataram experiências similares.

"Este estudo" - conclui o Prof. Griffiths - "mostra a necessidade de investigação sobre adaptações neurais e efeitos retardados induzidos por videogames, como forma de encorajar uma apreciação segura e saudável dos games".

O estudo foi publicado no International Journal of Human-Computer Interaction e pode ser lido na íntegra aqui (em inglês).

Imagens: GTA HUD e Curitiba Street 

Daniel Lemes
Daniel Lemes
Fundador do MB, quase mil artigos publicados em dez anos pesquisando e escrevendo sobre games. Ex-seguista, fã de Smashing Pumpkins e Yu Suzuki.

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