CVGV #1 – O Maníaco por Rayden

Depois de tanto ler e me divertir com causos alheios sobre os tempos de jogador de videogames, resolvi compartilhar eventos pessoais engraçados, cômicos, emocionantes e / ou toscos do meu tempo de gamer infantil e adolescente. Apesar de jogarmos ainda hoje, é no passado que estão as maiores artes aprontadas e muito da diversão que vivemos.

Aliás, vou fazer melhor que isso: vamos manter essa nova seção no Memória BIT, os Causos Verídicos de Gamers "Veteranos", o popular e já famoso CVGV. Entre aspas, porque não precisa ser veterano: se você é novato mas tem histórias pra contar, também pode participar.

A primeira cobaia serei eu mesmo, e fiquem à vontade para fazer login e começar a contar seus podres e dos amigos também. Se tiver algum causo real pra contar, não hesite em mandar pra cá, divida conosco seus momentos de zoeiras passadas.

Quero deixar claro que são todos 100% verídicos (pelo menos os meus, não me responsabilizo por lorotas criativas dos outros autores), e se não tiverem graça, azar o seu. Pra mim foram importantes e fazem parte de minha memória afetiva ou "odiativa". Estou certo que se você leitor tiver uns 30 anos ou quase isso, vai se identificar com algumas situações contadas hoje e nos próximos posts.

O Maníaco por Rayden

Quando: por volta de 1993
Onde: São Paulo, ZN
Moral da história: "Pá, pá, pá, pá, pá, soco... Pá, pá, pá, pá, pá, soco... "


Cage SNES FatalityMortal Kombat
no Super NES pode ter sido um joguinho estranho e cheio de motivos pra rir, mas nem por isso era pouco desejado pelos fãs da Nintendo e até de outras empresas. A vontade de curtir a carnificina virtual no conforto de nossos lares era tanta que até mesmo aquela coisa capada da característica que lhe deu fama (a violência) servia.

Quem tinha SNES ficou todo pimpão quando as revistas anunciaram o lançamento futuro, e mais ainda quando começaram a aparecer as imagens, parecia estar ficando bem interessante, gráficos bonitos e fiel ao arcade. Lembro que na mesma época estavam divulgando imagens prévias de Street Fighter II' do Mega Drive, aí ficava o papinho "Street do Mega vai ser melhor que Mortal do SNES" e vice-versa.

Mas quando o game apareceu foi uma chacota só, com a tal baba branca no lugar de sangue e os fatalities trocados por uns movimentos grotescos. Tipo, que *orra foi aquela que fizeram com o Johnny Cage, dando uma pezada na barriga do derrotado? Eu, que tinha Mega Drive, claro que rachei o bico dos donos de SNES; tais chances eram raras, já que a Nintendo costumava caprichar em ports de arcade.

Mas isso não quer dizer que eu não curtia. Nessa época, quem não tinha um aparelho não necessariamente odiava o concorrente, pelo contrário: sempre que surgia a oportunidade de jogar um pouco na locadora ou emprestado de um amigo, a gente não desperdiçava. Mesmo nunca tendo NES, por exemplo, cansei de jogar o Nintendinho de um carinha aqui da rua, porque fazíamos a troca (eu disse troca, e só troca) do meu Master pelo Top Game dele, coisa de uma semana ou mais. Todo mundo fazia isso, com exceção dos enjoadinhos, dos ricos que tinham todos os videogames, ou que eram proibidos pela mãe ou pai.

Mas SNES, pelo menos entre amigos mais próximos, era raridade. Até o alienígena 3DO tinham (claro que não emprestavam, não que alguém fizesse muita questão exceto por Road Rash...), mas SNES, nenhum perto que eu me lembre. O jeito fácil de jogar era naqueles "falsos arcades", que levam um videogame dentro e a gente pagava por hora nas locadoras; funcionavam sem fichas e controlados por um timer digital. Era feio, parecia um arcade sem as pernas, o controle uma porcaria, quebravam à toa, e volta e meia a gente pagava pra jogar e o bicho estava com um botão ou direcional estragado. Mas fissura de moleque supera essas traumas, e todo mundo se acabava de jogar SNES naquilo.

Eu frequentava uma locadora da região (a saudosa Polly Games, na Augusto Tolle, ZN de São Paulo) que tinha colocado uma máquina dessas e vivia abarrotada de moleque o dia todo. Quando chegou MK, um cartucho ficava só pra "máquina" e ela estava SEMPRE ocupada, os caras faziam plantão na porta pra pegar ou o outro cart (se não me engano eles não aceitavam, ou diziam não aceitar reservas), ou o lugar na máquina antes da turba.

air guitar
Quem acha Air Guitar ridículo é porque não viu o Air SNES

Quando digo plantão, não pense que estou exagerando ou usando figura de linguagem. Eu e amigos que moravam um pouco longe podíamos no máximo pular cedo no sábado, engolir vorazmente o café-da-manhã e tentar chegar o mais depressa possível na locadora. Quem chegasse primeiro pagava duas horas ou mais de máquina e os atrasados que se ferrassem esperando a vez deles.

Mas sempre tinha um grupo de moleques que moravam nuns prédios ali perto e já estavam por lá "guardando o lugar"; sempre com a cara amassada de sono e diziam que tinham acabado de chegar. E SEMPRE OS MESMOS, talvez uns sete ou oito, quase todos mais novos que nosso grupo. Dizíamos que eles deviam dormir por ali mesmo, o que não me surpreenderia se fosse verdade.

Ainda por cima eram chatos, pois quando a locadora atrasava um minuto pra abrir (o que acontecia normalmente às 9:00h), batiam na porta ou gritavam pelo dono, que morava no fundo.

– Que hora abre? Abre aí, a gente quer jogar. Não vai abrir hoje??

Entre esses, um é inesquecível (esqueci o nome), pois tinha hábitos incomuns... Não bastasse estar sempre de chinelo e uma roupa que pra mim parecia pijama, ele andava invariavelmente descabelado. Tenho certeza total de que ia direto da cama pra locadora, até imagino a cena do maluco levantando desvairado, correndo pra rua ao som de Carruagens de Fogo pra chegar primeiro no arcade...

Pra completar o absurdo, enquanto esperava a locadora abrir, ficava fazendo um tipo de "air SNES", ou melhor, repetindo num joystick imaginário o comando do fatality do Rayden. Com direito a um forte golpe no botão ar no final. E ainda rolava uma onomatopeia:

– Pá, pá, pá, pá, soco. Pá, pá, pá, pá, soco...

Quem conhece o game sacou que o "pá, pá..." eram os comandos frente e trás. Ele dava tapinhas no controle invisível pra frente e pra trás, e fingia que apertava o botão de soco. Quando perguntado sob olhares incrédulos e risos sobre o que era aquilo, ele confirmava sem um pingo de vergonha:

– Fatality do Rayden, tô treinando. Pá, pá, pá, pá, soco...

Pior é que quando ia jogar ele espancava violentamente o controle do pseudo-arcade e quase nunca acertava o fatality. O dono da loja ou a namorada tinha que pedir pra ele maneirar senão era um controle quebrado por semana.

 

Se você também tem histórias cômicas, pitorescas ou bacanas em geral pra contar, mande pra cá!

Daniel Lemes
Daniel Lemes
Fundador do MB, mais de mil artigos publicados, mais de dez anos pesquisando e escrevendo sobre games. Ex-seguista, fã de Smashing Pumpkins e Yu Suzuki.

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